“Porém, a Maçonaria ao referir-se a essas Ciências, o faz com puro intuito de dirigir as referências apenas ao simbolismo, e cabendo aos Integrantes conscientizarem-se de que ‘toda Ciência cria a Arte’; e como conceito, dizer que ‘constantemente as Ciências ensinam algo específico’. E, às pretensões da Ordem quanto as Ciências, a Instituição cogitou utilizá-las aplicando-as nos trabalhos operativos, passando-os a especulativos, abrangendo especialmente a Lógica. Já os Companheiros devem bem estudar as Sete (7) Disciplinas, para depois demonstrar conhecimento nessas áreas, pois promovem o surgimento do caminho que levará à iluminação. (D’Elia Junior, 2011, págs. 134-135)
INTRODUÇÃO
Durante a Idade Média, as corporações da
Maçonaria Operativa mantinham um sistema de aprendizado de longa duração, compreendendo
um período que ia de três a doze anos, e que incluía o ensino das sete ciências.
Também eram chamadas de Sete Artes e Ciências
Liberais. Em nossos dias atuais, dentro do cabedal de instruções inerentes ao Grau
de Companheiro-Maçom, a temática referente às artes e ciências liberais está inserida,
no entanto, é possível perceber que Rituais mais antigos do Grau de
Companheiro-Maçom, na sua Primeira Instrução era feita uma alusão às sete artes
e ciências por ocasião das explicações referentes ao simbolismo dos números
três, cinco e sete, onde este último perfaz a quantidade de Artes e Ciências:
Gramática, Retórica, Lógica, Aritmética, Geometria, Música e Astronomia.
Por um lado, é possível concordarmos que não
haveria tempo suficiente para nos aprofundarmos em cada uma das Sete Artes e
Ciências Liberais durante o tempo limitado à Instrução em Loja diante do que
seria um conteúdo extenso a ser abarcado se levadas, dada uma delas, ao pé da
letra, mas, queremos deixar muito claro aqui, que é no período de instrução,
durante uma sessão de 2º Grau, que ao Companheiro-Maçom deve ser dado esse
conhecimento primeiro, ou seja, uma descrição sobre o que cada uma delas
representava na antiguidade, e do motivo pelo qual o Maçom deverá possuir essa
noção já que ela se torna imprescindível quando se pretendente inculcar um
conhecimento não somente a respeito do simbolismo dos números, mas, do que cada
uma dessas Artes e das Ciências (uma descrição concisa a respeito de cada uma
delas) representou na Antiguidade e pode ainda ensinar ao Companheiro Maçom em
termos de simbolismo, sendo que, um aprofundamento sobre o tema, na medida do
possível, ficam a cargo do Companheiro Maçom que deverá realizar as leituras
complementares necessárias, para as quais poderá receber orientação.
Por outro lado, devemos entender que o mundo
mudou bastante, sim. No clássico “A Simbólica Maçônica” de Boucher, que já possui
bem mais de meio século, em determinado momento ele cita Plantageneta que assim
já se manifestava sobre o REAA e as Sete Ciências Liberais:
“O Rito
Escocês retoma a nomenclatura das sete ciências liberais nas quais o maçom deve
conservar a sua fé, tal como era dada pela antiga constituição dos operativos,
e que enumerava a Gramática, a Retórica, a Lógica, a Aritmética, a Geometria, a
Música e a Astronomia. Hoje ainda, portanto, o Neófito recebe a comunicação das
definições respectivas das sete ciências, e essa reminiscência dos antigos
costumes seria infinitamente tocante se, a partir do século XIII, o progresso
não nos tivesse fornecido os dicionários e se, desde nossa mais tenra infância,
não nos tivéssemos familiarizado com o seu uso.” (Boucher, 2009, pág. 237)
Independente da
“crítica” de Plantageneta, a ênfase vai para o simbolismo que essas disciplinas
inspiram quando interpretadas. O Ir.’. Theobaldo Varoli Filho brinda-nos com
uma bela e sucinta explicação:
“Maçom
deve falar pouco e bem (retórica e Gramática) e exprimir a Verdade (Lógica).
Deve ‘’contar e medir seu pensamento, seus planos, sua imaginação e suas ações’
(Aritmética e Geometria). Deve viver em harmonia com seus Irmãos (Música),
mantendo entre os Maçons uma ligação e atração, com afabilidade e humildade,
sem esquecer a sua insignificância diante do Grande Arquiteto do Universo,
autor da Obra Máxima, a de todos os astros que se atraem mutuamente
(Astronomia).” (Varoli Filho, 1976, pág. 132)
E após a sua
interpretação, o Ir.’. Varoli tece alguns comentários (do tipo que não tem
prazo de validade) que em conjunto com o trecho acima, merecem ser repassados no
período de Instrução, e no caso por se tratar de tema afeto ao Grau 2, em Loja
de Companheiro Maçom. Vejamos:
“Se tais regras predominassem nas Lojas, não haveria certos Obreiros que se põem a perturbar os trabalhos maçônicos alongando as sessões com as suas arengas intermináveis e fastidiosas. Aí está a razão de se limitar o tempo das sessões maçônicas. Esse tempo deve ser medido, para acostumar os Obreiros a não cansarem os seus Irmãos com discursos demasiado gongóricos. (...) O palavrório oco e dialética inconsistente são as duas maiores causas do esvaziamento dos Templos Maçônicos.” (Varoli Filho, 1976, págs. 132-133)
UM POUCO DA HISTÓRIA
Às ordens monásticas medievais, conforme o
Irmão Varoli Filho, se deve o ensino gratuito e a disseminação da cultura,
sendo que, aos beneditinos, se deve essa prática.
Foi Cassiodoro (468-561) quem fundou um convento
em sua propriedade da Apúlia e ordenou aos monges que passassem a copiar os
manuscritos antigos, além de praticar as sete artes liberais.
Boécio,
filósofo grego, contemporâneo de Cassiodoro foi quem fez a distinção das artes
em Trivium (Gramática, Retórica e Lógica) e Quadrivium (Aritmética, Geometria,
Música e Astronomia), o que tinha relação com a divisão dos estudos em dois
ciclos.
O Trivium e o Quadrivium formavam as sete
ciências e artes liberais e foram o centro da educação no mundo ocidental até,
pelo menos, o início da Era Moderna.
É bom que se comente antes que no que se
refere ao Quadrivium (o qual englobava as quatro antigas ciências dos números,
elas foram formuladas originalmente no mundo ocidental pela Fraternidade
Pitagórica, sendo que, nesse tempo mais remoto tinham uma definição um tanto
diferente do que seria hoje. Exemplificando: a “aritmética” abarcava uma boa
dose de simbolismo numérico, além da aritmologia (ciência esotérica dos
números) e da aritmancia (adivinhação feita por intermédio dos números, ou
numerologia); a “geometria” tinha o seu lado místico também, onde fazia constar
aquilo que se convencionou chamar de geometria sagrada; a “música” englobava as
diversas artes, e focava principalmente nas ligações numéricas harmoniosas; a
“astronomia” estava associada com a astrologia.
Elas desempenharam um papel importantíssimo
no ocultismo renascentista, fato que até pode ser o responsável por fazer com
que o Quadrivium tenha sido posto de lado após o surgimento das filosofias
materialistas no século XVII.
Quando foram adotadas no século XII na
França, acreditava-se que elas reunidas possibilitariam o meio mais adequado
para o conhecimento de Deus. O número sete, como sabemos, é um número com
características esotéricas, e a Maçonaria o tem como um dos números sagrados
juntamente com os números três e cinco.
No entanto, se considerarmos o número sete
somente em relação às ciências e à importância delas, o número se tornou com o
passar do tempo bastante restritivo, pois, muitas outras disciplinas foram
surgindo e adquiriram desenvolvimento.
Tanto que hoje em dia, são consideradas Artes Liberais as profissões autônomas que se veem em todas as atividades, onde podemos afirmar também que o vocábulo “arte autônoma” substituiu a “arte liberal”. Em nossa Ordem, o profissionalismo não é tudo para ser levado em conta, pois, são aceitos candidatos que sejam em primeiro lugar donos das seguintes condições: dignidade, moralidade e conhecimento, e tanto faz exercer uma profissão liberal ou ser empregado, ou seja, não é o seu tipo de trabalho ou de recursos, que está sendo medido, mas, ele deve garantir recursos suficientes para com os seus gastos com a Ordem. (Rizardo Da Camino, pág. 51, 2006)
MAÇONARIA: SOBRE O SIMBOLISMO DAS SETE ARTES
E CIÊNCIAS
Já nas “Old Charges” havia referências às
Artes e Ciências Liberais, e a partir do momento em que foi fundada a Maçonaria
Especulativa, elas ficaram fazendo parte do sistema de instruções que eram
ministradas aos maçons. Num primeiro momento faziam parte do Grau de Aprendiz,
já que este era o Grau mais importante desse período. Após, passaram a fazer
parte de Grau de Companheiro, pelo fato de que este é o Grau simbólico da
Ciência, e foram então representadas pelos sete degraus da escada em espiral.
(Aslan, 2012)
Para dar uma ideia mais completa do
simbolismo que tais disciplinas podem inspirar ao Companheiro Maçom, veremos
algumas definições extraídas do “Vade-Mécum Maçônico” do Ir.’. João Ivo
Girardi, e na sequência algumas complementações úteis transcritas do livro
“Maçonaria 50 Instruções de Companheiro” do Ir.’. Raymundo D’Elia Junior.
No “Vade-Mécum Maçônico”, encontramos as
seguintes definições:
“Geometria: (proporciona o
conhecimento das proporções e dimensões do corpo).
Aritmética: (que empresta valor
verdadeiro aos números: a fim de não errar nos cálculos).
Gramática: (ensina através de regras
próprias, a linguagem, o expressar das ideias).
Retórica: (adorna e embeleza a palavra, criando um estilo individual).
Música: (dá doçura e harmonia aos
sons, com reflexos gratos ao coração e sentimentos).
Astronomia: (que ensina e demonstra a
ordem e o equilíbrio perfeito do firmamento).”
Lógica: também conhecida como Dialética
(para formar juízos e concepções exatas de todas as coisas).” (Girardi, 2008, págs.
93-94)
Do livro “Maçonaria 50 Instruções de
Companheiro”, retiraremos passagens referentes a cada uma destas disciplinas
para que o Ir.’. Companheiro Maçom possa ter uma ideia mais completa a respeito
de cada uma delas, ao mesmo tempo que lhe possam ser úteis nos estudos que
deverão empreender pela frente. Vejamos estas complementações:
“Geometria(Ciência
e Arte da Abstração): Não há um único símbolo da Maçonaria que dispense a
Geometria, como exemplo, Coluna,
Avental, Estrela ou outro; e, na criação, a nenhum símbolo foi dispensado o
respectivo ‘traçado geométrico’; complementando, afirmar que os ângulos,
triângulos, polígonos, circunferências, pontos, retas e curvas, com efeito, são
os elementos componentes dessa importante Ciência que é a Geometria, tanto
assim que ao reconhecer ser tamanha a importância da Arte, o Companheiro passa
a entender o G.’.A.’.D.’.U.’., como ‘O Grande Geômetra; assim, o Companheiro
deve ser primeiro instruído na Geometria...”
Aritmética(Ciência
Teórica que Envolve os Números): Trata-se a Aritmética de uma importante habilidade,
que se constitui num atributo básico a todo Maçom, porque sem essa Ciência nada
que é proposto pode ser realizado, pois, como sempre é buscada a verdade,
sabe-se a vital importância da ‘precisão
dos cálculos’.
Gramática(Arte
da Comunicação Correta): A Gramática entendida como a Arte de falar,
ler e escrever corretamente; seu domínio facultará ao Integrante escrever e
interpretar Leis, como se fosse qualquer outro veículo ou instrumento conhecido
de educação e cultura; então, saber Gramática é capacitar-se, ser um governante,
e estar apto a ensinar quem necessita.
Retórica(Arte
do uso da Linguagem para Impressionar): A Retórica é considerada a Arte
consequente da Gramática, e entendida como o conjunto de técnicas que comunica
uma ideia de modo persuasivo, objetivo e claro; assim, demonstra a Arte de
discorrer sobre vários temas, apesar que todo discurso exige obediência a
certas regras, dentre essas, deve ser limitado, pois já diziam os antigos: “Se
quiseres agradar, fales pouco!
Lógica(Arte
e Ciência de Pensar Apropriadamente): Essa Ciência ensina ao Companheiro a se tornar
reto, justo, leal, compreensivo e tolerante, e além, faz com que seja
conhecedor do que é certo: Apesar da conveniência em ser um atributo inato ao Homem,
o concedido raciocínio lógico não pode ser verificado em qualquer indivíduo;
ademais, deve-se depreender que as conclusões decorrentes e suportadas pela
razão só podem florescer numa mente treinada, tranquila, ponderada e reflexiva.
Astronomia (Ciência
do Metafísico e Celestial): A Astronomia é entendida como a Arte do
estudo dos astros, e de outras características. Mostra ao Companheiro a
relatividade das Ciências Exatas; por isso, o que é uma reta vista da
perspectiva da Terra, sem dúvida torna-se uma curva aos ser observada de outro
corpo celeste. De maneira maçônica, se o Templo que contempla a Loja é
considerado uma espécie de reprodução e retratação do Universo, então a
Astronomia passa a ser a Ciência que o estuda, e ao prover esse estudo o Companheiro
buscará erguer os olhos da Humanidade ao infinito.
Música (Arte e Ciência da Harmonia; Evolui da matemática): A Música caracterizada por ser ‘o mais perfeito código universal de comunicação’, jamais necessitou de qualquer tradução, pois pode ser decodificada no espírito do homem, vindo a despertar sua harmonia universal que passa a promover; assim, a Música é uma Ciência complexa, pois se sublima quando o Homem, desde o nascimento, domina o som, por habilidade quase inata.” (D’Elia Junior, 2011, págs. 137-141)
COMENTÁRIOS FINAIS:
O Ir.’. e pesquisador Édouard E. Plantageneta,
quando escreveu o trecho que foi reproduzido anteriormente, havia mencionado os
dicionários como sendo um dos grandes recursos legados pelo progresso. Dá para
imaginar se ele chegasse a viver em nossos dias atuais, em meio aos
computadores e à enxurrada de informações disponíveis. A pergunta é: Qual o
sentido para o estudo das artes e das ciências liberais na Maçonaria da
atualidade?
Em tempos bem mais antigos essas artes eram
enaltecidas, e eram contados nos dedos aqueles que tinham acesso às informações
contidas naquele conjunto todo. Havia uma lenda aliada ao próprio número sete, número
esotérico, e dos mistérios que elas encerravam numa época que o acesso ao
conhecimento era muito restrito, e quando não era secreto. Elas representavam todo
o conhecimento do mundo da antiguidade e representavam os sete degraus que
conduziriam aqueles que verdadeiramente estudassem e persistissem em querer auferir
o máximo de conhecimentos sobre o Eterno.
Nos moldes aqueles, no estágio em que foram
herdadas pelos monges e depois pela Maçonaria da época, propiciavam um
conhecimento incomum, uma porta de acesso para lugares que somente a mente com
a sua imaginação poderia fazer chegar.
Mas, hoje aquilo tudo pode até ser
considerado arcaico, restando, isto sim, o simbolismo que cada uma delas
contém. Tudo evolui, não obstante, o legado maçônico simbólico sobre aquelas
matérias em seu conjunto que em determinada época pôde ser denominado “uma soma
total do saber” onde os antigos conhecimentos com suas lições que se
depreendem, ainda permanecem, e sim, ajudam-nos em nossa caminhada em direção
ao Templo do Saber, afinal como bem apontou o Ir.’. Nicola Aslan:
“São, quando devidamente interpretadas, o símbolo do progresso no conhecimento.” (Aslan, 2012, pág. 148)
CONSULTAS BIBLIOGRÁFICAS:
ASLAN, Nicola. “Grande Dicionário
Enciclopédico de Maçonaria e Simbologia” (Volume I) – Editora Maçônica “A
Trolha” Ltda. - 3ª Edição – 2012
BOUCHER, Jules. “A Simbólica Maçônica” -
Editora Pensamento
DA CAMINO, Rizzardo. “Dicionário Maçônico” -
Madras Editora Ltda. 2006
D’ELIA JUNIOR, Raymundo. “MAÇONARIA - 50
Instruções de Companheiro” – Madras Editora Ltda. - 2011
GIRARDI, João Ivo. “Do Meio-Dia à Meia-Noite
– Vade-Mécum Maçônico” - Nova Letra Gráfica e Editora ltda. 2ª Edição – 2008.
GREER, John Michael. “Dicionário
Enciclopédico do Pensamento Esotérico Ocidental” – Editora Pensamento-Cultrix –
1ª Edição - 2012
PETERS, Ambrósio. “MAÇONARIA – História e
Filosofia – GOEP – 1999 – 2ª Edição
RITUAL E INSTRUÇÕES DO GRAU DE
COMPANHEIRO-MAÇOM DO R.’.E.’.A.’.A.’. – Edições: 2009 e 2017 - GORGS
VAROLI FILHO, Theobaldo. “Curso de Maçonaria
Simbólica” - 1º Tomo (Aprendiz) Editora A Gazeta Maçônica S.A. - 1977 – 2ª
Edição
VAROLI FILHO, Theobaldo. “Curso de Maçonaria
Simbólica – 2º Tomo (Companheiro) – Editora A Gazeta Maçônica S.A. - 1976 – 1ª
Edição
(*) Irmão José Ronaldo Viega Alves
Loja Saldanha Marinho, “A Fraterna”
Oriente de S. do Livramento, RS.
0 Comentários