As Constituições de Berlim de 1786 e a Consolidação do REAA

 


Da Redação

As Constituições de Berlim de 1786 foram promulgadas na cidade de Berlim nas calendas de maio daquele ano e são atribuídas ao rei Frederico II da Prússia. Este monarca, conhecido por seu pensamento iluminista, teria sancionado o documento já com 47 anos de reinado. Essas Constituições estão profundamente ligadas à origem do Rito Escocês Antigo e Aceito (REAA), estabelecendo as bases filosóficas, sociais e humanitárias da Ordem.

No preâmbulo deste documento, Frederico II se apresenta com títulos honoríficos que destacam sua posição dentro da Maçonaria, como "Soberano Protetor" e "Grande Comendador da Antiguíssima e Muito Respeitável Sociedade de Antigos Franco-maçons ou Arquitetos Unidos". As Constituições foram elaboradas com o objetivo primordial de promover "a união, a felicidade e o bem-estar da família humana em geral e de cada homem em particular". Para isso, Frederico II consolidou e sistematizou todos os ritos do regime escocês conhecidos na época, incluindo o Rito Antigo, o Rito de Heredom, o Rito do Oriente de Kilwinning, o Rito de San Andrés, o Rito dos Emperadores de Oriente e Ocidente, o Rito dos Príncipes do Real Segredo, o Rito Filosófico e o Rito Primitivo.

 A Estrutura do Rito Escocês Antigo e Aceito

A principal reforma de Frederico II consistiu na unificação desses sistemas rituais sob uma única Ordem, denominada originalmente "Ordem Real Militar da Antiga e Moderna Franco-Maçonaria". A partir desse momento, o Rito passou a ser composto por 33 graus, cada um com um ritual específico, estabelecendo-se um percurso de elevação espiritual e intelectual para os maçons.

O trigésimo terceiro grau recebeu o título de "Soberano Grande Inspetor Geral", e os detentores desse grau se tornaram guardiões da Ordem, reunindo-se em Supremos Conselhos, responsáveis por administrar e preservar a doutrina e os regulamentos da Maçonaria Escocesa. As Constituições de 1786 também estabeleceram a igualdade entre todos os Supremos Conselhos do mundo, reconhecendo sua origem comum.

 O Desenvolvimento do REAA e a Influência de Étienne Morin

O comerciante francês Étienne Morin teve papel fundamental na disseminação dos graus filosóficos da Maçonaria Francesa no Caribe, na América Central e nos Estados Unidos. Embora não haja registros definitivos, acredita-se que Morin tenha sido iniciado entre 1742 e 1745. Seu envolvimento com a Maçonaria está documentado em registros de visitas a lojas em Bordéus, onde ocupou cargos de destaque.

Em 1761, Morin recebeu poderes para difundir e administrar os graus superiores da Maçonaria, o que resultou na formação do chamado Rito de Perfeição, composto por 25 graus. Posteriormente, esses graus foram incorporados ao REAA quando da criação do Supremo Conselho do Grau 33 nos Estados Unidos, em 1801, na cidade de Charleston (Carolina do Sul). Em 1804, foi estabelecido o Supremo Conselho da França pelo conde de Grasse-Tilly, consolidando a expansão do REAA na Europa.

 O Convento de Lausana e a Regularidade Maçônica

Em 1875, o Supremo Conselho da França convocou os 22 Supremos Conselhos então existentes para um Convento Universal realizado em Lausana, Suíça. O objetivo desse encontro foi revisar e reafirmar os princípios fundamentais do REAA, com base nas Constituições de Berlim de 1786. O evento resultou em uma série de medidas importantes, incluindo a formulação da "Declaração de Princípios do Rito", a criação de um Tratado de Aliança entre os Supremos Conselhos e a instituição de conferências internacionais regulares.

Um dos pontos centrais do Convento foi a definição do conceito de "Grande Arquiteto do Universo" (GAU). Os delegados decidiram não identificá-lo com o Deus das religiões tradicionais, propondo formulações mais universalistas como "Princípio Criador" ou "Força Superior". Essa abordagem permitiu conciliar a tradição espiritual do REAA com a liberdade de consciência individual, afastando a Maçonaria de uma postura dogmática.

 O Impacto do Convento de Lausana e a Questão da Regularidade

O Convento de Lausana consolidou um modelo de regularidade maçônica baseado no respeito à tradição, mas também na abertura à diversidade de interpretações espirituais. Essa posição, no entanto, não foi unanimemente aceita. Os Supremos Conselhos anglo-saxões, particularmente a Jurisdição Sul dos Estados Unidos, rejeitaram alguns dos acordos, temendo a formação de uma entidade maçônica supranacional que pudesse ameaçar sua hegemonia.

Essa divergência resultou na coexistência de duas interpretações distintas de regularidade dentro do REAA: uma mais espiritualista e universalista, baseada nos princípios de Lausana, e outra mais estritamente teísta, característica dos Supremos Conselhos anglo-saxões. A principal diferença entre essas abordagens reside na forma como interpretam o conceito do Grande Arquiteto do Universo e na exigência de crença em um Deus pessoal para a iniciação.

 Conclusão

As Constituições de Berlim de 1786 representaram um marco na organização do Rito Escocês Antigo e Aceito, consolidando sua estrutura de 33 graus e estabelecendo os Supremos Conselhos como guardiões da doutrina maçônica escocesa. O Convento de Lausana de 1875 reforçou esses princípios, promovendo uma visão mais ampla e tolerante da espiritualidade dentro da Maçonaria. A interpretação do Grande Arquiteto do Universo continua a ser um ponto de dissensão entre diferentes correntes do REAA, refletindo as complexidades da tradição maçônica e sua evolução ao longo dos séculos.

 




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