COMENTÁRIOS:
Com o cronograma que
foi montado e apresentado no último capítulo (VII), cumprimos um objetivo maior
que foi o de proporcionar ao leitor criar uma ideia da atmosfera daquela época,
seja através dos eventos e fenômenos históricos que ali foram seletivamente elencados
por estarem relacionados ao assunto que está sendo abordado, seja através das mudanças
que ocorriam dentro da própria Maçonaria, ainda que, essa transformação ou o
período de transição, ou ainda, essa nova Maçonaria que manteria uma relação
simbólica apenas simbólica, no entender de alguns, com a Maçonaria Operativa, a
princípio, transcorreu de forma lenta. Com isso, acreditamos ser possível analisarmos
alguns daqueles acontecimentos ocorridos dentro daquele contexto e assim poder unir alguns pontos dessa história, ainda
que, como todos nós sabemos a história da Maçonaria, seja durante quaisquer uma
das fases que foram convencionadas a Operativa, e depois a Especulativa ou
Moderna, permanecem com muitos détails en suspens(18).
Após a Maçonaria Especulativa ter
engrenado os seus passos em direção à sua futura consolidação, entendemos que
alguns dos acontecimentos que ali constaram, por sua importância e por seus
desdobramentos até imprimiram um ritmo maior em direção às mudanças mais
significativas que viriam. Merece devido destaque, analisarmos o despontar de uma
sociedade que agora tem sido objeto de maiores estudos na sua relação com a Maçonaria,
já que, influiu ou possuiu ligações com esta última, sabidamente, nas suas
primeiras décadas de existência. Com isso, pretendemos responder à pergunta
colocada no início do capítulo anterior, e que no decorrer deste pretendemos
ver respondida. A pergunta era a seguinte:
“Que tipo de conexões podem
ter existido entre a Royal Society e a Maçonaria”?
O nosso cronograma retrata
então os acontecimentos (não todos, obviamente), mas, os que tem repercussão em
nosso trabalho.
Séculos XVII e XVIII: o mundo
atravessava uma nova fase de efervescência em ideias, e na Maçonaria grandes
mudanças estavam em curso. A união de uma filosofia provinda da tradição
hermética-cabalística, junto com a fórmula iluminista fundamentada na razão,
era o ideário que estava sendo gestado para a nova Maçonaria.
Há um artigo de autoria de
Cécile Révauger, historiadora francesa e pertencente a Grande Loja Feminina da
França, intitulado “Royal Society, a antecâmara da Maçonaria”, o qual, devo
confessar, fez com que o título acabasse me perseguindo por muito tempo até que
a curiosidade fez despertar de vez meu interesse em descobrir muito mais a
respeito da Royal Society daqueles primeiros tempos, pois, concomitantemente,
a Maçonaria Moderna também dava seus primeiros passos.
Há um artigo que foi imprescindível
para a feitura do texto que segue, eis que, o seu autor mostrou nele um grande
poder de síntese. Na verdade, é uma palestra que o Ir.’. Gary Muir proferiu na Hawke’s
Bay Research Lodge No 305, da Nova Zelândia. Dessa sua palestra intitulada “Maçonaria
e a Royal Society”, é que foram extraídas preciosas informações, assim
como, do livro “A Maçonaria e o Nascimento da Ciência Moderna – “O Colégio
Invisível”, de autoria do pesquisador da história da Ordem, Ir.’. Robert Lomas.
O Gresham College
Para falar sobre esse assunto,
é interessante sabermos que a Royal Society tem uma antecâmara também, a qual funcionava
no Grehsham College.
Lá por volta de 1645, um grupo
de homens cultos se reunia nesse colégio para assistir palestras e discutirem
assuntos relativos àquilo que na época se chamava de filosofia experimental ou
nova.
Sir Thomas Gresham, fundador
do Gresham College estabeleceu, via testamento, que as disciplinas a serem
ensinadas eram as seguintes: divindade, medicina, geometria, astronomia,
retórica e música. Antes de falecer, ele foi nomeado Diretor Geral Adjunto dos Maçons,
então seria coerente até supor que ele buscou incutir ali os princípios maçônicos.
Esse grupo é o que o pesquisador Robert Lomas, em seu livro “A Maçonaria e o
Nascimento da Ciência Moderna”, designou como o “Colégio Invisível”.
O tema comum, pode-se dizer
dessa faculdade era obter conhecimento por meio da pesquisa experimental, das causas
e dos efeitos, e a partir daí encontrar aplicações práticas para as suas
descobertas.
No ano de 1660, o “Colégio
Invisível” estava composto por doze homens, sendo que, durante a Guerra Civil, alguns
deles haviam tomado partido de um lado, assim como, outros do lado contrário.
E chegando neste ponto é que
Lomas se perguntou em seu livro:
“O que poderia ter juntado
esses inimigos para estabelecer uma sociedade científica? (Lomas, 2007, pág.
31)
Do grupo aquele de filósofos
naturais e cientistas, um deles era Christopher Wren, professor na
faculdade e mais tarde Maçom. Também estava Robert Moray que, junto com Elias
Ashmole eram os participantes mais ativos do “Colégio Invisível”, entre
outros.
Sir Robert Moray era um dos
que tinha lutado em ambos os lados da guerra civil, era também espião francês e
se tornou uma figura fundamental para que Carlos II fosse coroado rei da
Escócia.
Como já vimos anteriormente, a
Escócia teve um papel primordial na aceitação na sua guilda de pedreiros de
membros cavalheiros, ou daqueles que não eram praticantes do ofício dos
pedreiros e que por tradição já, detinham o conhecimento matemático e
científico dessa arte.
Sir Robert Moray foi iniciado
na Loja Edimburgo em 1641. Devido às suas boas relações com o rei Carlos II, ele
foi escolhido como o homem mais adequado para solicitar a aprovação e o apoio do
rei para o “Colégio Invisível”.
O resultado: o rei endossou os
princípios que norteavam o colégio, recebeu o convite para ser patrono e
concedeu a esse colégio um mandado real.
A Royal Society
Em 1660, conforme acompanhamos
pelo cronograma é lançada oficialmente a Royal Society, com Moray
presidindo-a, e ele se baseou profundamente nos ensinamentos da Maçonaria,
proibindo quaisquer discussões que envolvessem política e religião, pois, ele
era consciente de que era o tipo de assuntos que normalmente dividiam os homens,
ao invés de uni-los.
O Maçom Christopher Wren, um
dos seus membros fundadores, ocupou a presidência da entidade de 1680 a 1682.
Na Sociedade, tal como numa Loja Maçônica, três oficiais são eleitos para
governá-la, sendo que o método de votação também é o mesmo utilizado nas Lojas
hoje em dia.
Ao longo dos anos muitos
outros cientistas/Maçons se destacariam no âmbito da Royal Society. Citemos alguns
exemplos:
John Aubrey (1626-1697)
_ a maioria dos seus escritos inéditos vieram à luz já no século XX. Em 1656
ele começou um dos seus livros A História Natural de Wiltshire, terminando-o
em 1691 e que somente foi publicado em 1847. Aubrey era antiquário, o seu livro
mais famoso é o The Lives of Eminent Men (Vidas de Homens Eminentes) e
realizava também trabalhos de campo, principalmente em Stonenge e Avebury.
Para essa última localidade afirmou ter havido ali um centro de culto dos
druidas.
Em uma das passagens do seu
livro sobre Wiltshire, é interessante vermos o que ele escreveu em
referência a um dos mitos que se contam as origens da Maçonaria:
“Sir William Dugdale me
contou, há muitos anos, que, na época de Henrique III, o Papa concedeu uma bula
ou patentes a uma companhia de maçons italianos para viajar por toda a Europa a
fim de construir igrejas. Destes, deriva a fraternidade dos maçons adotados.
Eles são conhecidos uns pelos outros por certos sinais e lemas: isso continua
até hoje. Eles têm várias lojas em vários condados para sua recepção, e quando
algum deles entra em declínio, a irmandade o substitui, etc. A forma de sua
adoção é muito formal, com um juramento de sigilo.”
COMENTÁRIOS:
É fundamental percebermos que
existem documentos e papéis diversos, os quais já foram mencionados ao longo
deste trabalho de pesquisa que contém registros importantes da história da Maçonaria.
Esses documentos nem costumam ser muito divulgados, ao contrário das Old
Charges, bastante citadas, algumas delas esmiuçadas. Registros como os que
constam no livro da Companhia dos Maçons de Londres, ou no livro de John
Aubrey, o qual acabamos de ver. Lembrei da Carta de Bolonha também. Enfim, como
buscadores devemos estar sempre abertos para novas leituras e novas
descobertas.
Na continuação, vejamos outro
Maçom famoso e que era membro da Royal Society:
John Theophilus
Desaguliers (1683-1744) _ foi um filósofo natural, clérigo,
engenheiros e Maçom britânico, nascido em La Rochelle, na França. Foi eleito
para a Royal Society no ano de 1714, na função de assistente experimental
de Isaac Newton. Com formação em Oxford, posteriormente, popularizou as teorias
newtonianas e suas aplicações práticas em palestras públicas. Sendo Maçom,
Desaguliers foi fundamental para o sucesso da Primeira Grande Loja de
Londres lá no início da década de 1720, vindo a ser o seu terceiro
Grão-Mestre, tendo exercido enorme influência na forma que ela tomaria a partir
do século XVIII.
Royal Society: além dos
Maçons, havia rosa-cruzes também
Isaac Newton
(1642-1727) _ foi um matemático, físico, astrônomo, teólogo e autor britânico,
o que no tempo em que viveu era descrito como um filósofo natural. Um
dos cientistas mais influentes de todos os tempos e, uma figura-chave no âmbito
da Revolução Científica. O seu livro mais famoso é o Philosofiae
Naturalis Pricncipia Mathematica (Princípios Matemáticos de Filosofia Natural),
de 1687, no qual foram lançadas as bases da mecânica clássica.
Num artigo escrito há alguns
anos, focando exatamente na questão de que a Royal Society possuía alguns membros
que eram rosa-cruzes, se falou que Isaac Newton era um deles. Outro famoso
rosa-cruz era Elias Ashmole, para ficar em nomes bastante conhecidos. Sabidamente
não há provas de que o primeiro deles, o grande físico Isaac Newton fosse Maçom,
ainda que, entre os mais próximos dele havia Maçons, a exemplo de John
Theophilus Desaguliers. No entanto, Desaguliers nunca se referiu a qualquer
coisa de Newton nesse sentido, permanecendo o mistério. Pelo que se sabe,
Newton foi sim bastante influenciado pela Rosa-Cruz, como atesta o grande
interesse que desenvolveu pelas pesquisas sobre a alquimia e a filosofia.
A título de ilustração,
destaco um trecho da wikipedia onde é possível detectar quão intenso foi
o interesse de Newton pela alquimia. Vejamos na sequência:
“Das cerca de dez milhões de
palavras escritas nos trabalhos de Newton, cerca de um milhão trata de alquimia.
Muitos dos escritos de Newton sobre alquimia são cópias de outros manuscritos,
com suas próprias anotações. Os textos alquímicos misturam o conhecimento
artesanal com a especulação filosófica, muitas vezes escondida por trás de
camadas de jogo de palavras, alegorias e imagens para proteger os segredos da
alquimia. Ao morrer, a biblioteca de Newton apresentava 169 livros sobre o
tópico da alquimia, e acreditava-se que teria consideravelmente mais livros
durante os anos de formação em Cambridge, embora possivelmente os tenha
vendido antes de mudar-se para Londres em 1696.”
Por outro lado, a respeito de
Elias Ashmole, sabemos que foi iniciado na Maçonaria, mas, que também era
Rosa-cruz.
Elias Ashmole (1617-1692)
_ foi um antiquário, político, oficial de armas, astrólogo,
maçom, estudante de alquimia inglês. Ashmole apoiou o lado monarquista durante
a Guerra Civil Inglesa, e com a Restauração de Carlos II foi premiado com
vários cargos bem remunerados.
Em 2 de janeiro de 1661
Ashmole foi eleito membro da Royal Society.
Robert Freke Gould, pesquisador
que estudou a vida de Elias Ashmole – para ele um “zeloso Rosa-Cruz” –
afirmou num dos seus livros que ele não tinha sido o primeiro Maçom aceito na
Inglaterra, e as lojas de Warrington e de Londres que ele
mencionou eram Lojas especulativas.
Royal Society: o simbolismo
maçônico
Alguns detalhes interessantes
vêm para tornar evidentes as influências, tanto de parte daqueles Maçons que
faziam parte da Royal Society, assim como, dos Rosa-cruzes, ou daqueles que
nutriam suas simpatias por ambas as doutrinas, como é o caso de Elias Ashmole.
Esse tipo de influências que é
possível de detectarmos são mencionadas no livro “O Mago da Franco-Maçonaria”,
da autoria de Tobias Churton, livro esse que compõe uma biografia bastante completa
da vida de Elias Ashmole.
Num primeiro momento vamos
tratar do frontispício do livro History of the Royal Society (História da
Royal Society)(19), de Thomas Spratt, o primeiro livro a contar
a história da Real Sociedade. Um dos aspectos a ser ressaltado é que fica por
demais evidente ali a relevância de Francis Bacon (vide nota nº 4, Cap. I) para
os fundadores da Royal Society. Numa relação que podemos considerar mais direta
com símbolos maçônicos, ao visualizar o frontispício do livro, logo já
poderemos detectar alguns: a lâmina mostra um aposento em que a sua parte frontal
jaz apoiada num arco e em dois pilares. O piso é quadriculado, branco e preto,
um símbolo esotérico bastante reconhecido na Maçonaria. Nas paredes há muitas
ferramentas que estão penduradas: compassos, esquadros, prumos, etc.
À esquerda do rei Carlos II,
aparece sentado William Brouncker, o então presidente da sociedade e à sua
direita, Francis Bacon. Todo o pessoal que aparece na parte de trás estão a cumprir
tarefas específicas e todas elas em combinação formam o que poderíamos significativamente
chamar de “o vasto estúdio da ciência”. Alguns extraem material dos livros,
outros fazem experimentos e outros cotejam os resultados. Ainda, há os que realizam
viagens, os que se dedicam somente à investigação e os que desenham novos
experimentos. Os Mestres da Casa de Salomão convertem todas as tarefas
cooperativas em teorias que devem ser coerentes e organizadas.
O interesse demonstrado aqui
por Bacon tem sua razão de ser: é pelo fato de que o autor de “A Nova
Atlântida” estabeleceu nessa sua obra, novas ideias sobre a investigação e a
ciência, e no caso, havia uma instituição exemplar que funcionava como um
modelo de casa de estudos para o benefício da humanidade, a Casa de Salomão.
Como podemos deduzir há muitas
influências, algumas diretas, outras indiretas.
A Maçonaria Especulativa estimulou
os seus membros a explorar “os mistérios ocultos da natureza e da ciência”, e
depois, “os caminhos da virtude e da ciência”, conforme o Ir.’. Gary Muir. A
Royal Society traduziu esse conceito em observação e experimento prático, sendo
que, foram muitos os benefícios advindos daí para o mundo moderno.
CONTINUA...
NOTAS:
détails en suspens(18)
– (fr.
detalhes em suspense)
History of the Royal Society
(História da Royal Society)(19): “A primeira história
completa da Real Sociedade foi publicada em 1667 e foi escrita por Thomas
Spratt sob direção de Brouncker, Moray, Wilkins e Evelyn. Como indicou a
historiadora Margery Purver, pode ser, portanto, considerada uma versão
definitiva do que os fundadores da Real Sociedade queriam registrar a respeito
de sua origem. Ela comenta assim a história de Spratt:
‘A história é a única
publicação que recebeu tal supervisão da Real Socidade em sua documentação; e
essa supervisão foi conduzida por aqueles que foram escolhidos por seu
conhecimento pessoal dos fatos. Ela mostra que Spratt não estava falando por
ele mesmo nem por qualquer outra pessoa, mas pela real Sociedade como
instituição, que considerava esse livro de seu especial interesse, o primeiro
relato público de sua origem, política e atividade.” (Lomas, 2007, pág. 68)
E ainda:
“A primeira história oficial
da Real Sociedade foi escrita por Thomas Spratt sob Wilkins e Moray. Ela afirma
que a ideia foi lançada em uma série de encontros promovidos por Wilkins
durante seu tempo em Oxford. Dois dos primeiros companheiros, Robert Boyle e
John Wallis, entretanto, dizem outra coisa. Ambos escreveram a respeito de outros
grupos formados e ambos usaram símbolos e ideias que são características da
Maçonaria para descrever esses outros encontros. Se acreditarmos em Wallis e
Boyle, havia grupos se encontrando sob condições maçônicas e usando simbolismo
maçônico em suas discussões. (Lomas, 2007, pág. 71)
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