Na Terra da Tequila: A Maçonaria no México e seu Papel na Independência e Política

por Jean-Moïse Braitberg

A Maçonaria Mexicana, ainda vibrante e ativa nos dias de hoje, tem suas raízes fincadas profundamente na história do país, onde desempenhou um papel notável não apenas na luta pela independência, mas também na modelagem das instituições políticas e na redefinição da relação entre o Estado e a Igreja Católica.

Se no imaginário coletivo o México é terra da tequila, dos mariachis e das cores vibrantes, é também solo fértil para uma tradição maçônica complexa, combativa e influente.

As origens coloniais: entre espanhóis e franceses

As primeiras lojas maçônicas chegaram ao território mexicano ainda sob o domínio colonial espanhol, no final do século XVIII. Instaladas por espanhóis e franceses, essas lojas operavam em sua maioria sob jurisdições europeias e estavam, inicialmente, ligadas ao poder real.

O objetivo principal era o de reunir elites letradas, militares e administradores coloniais — homens instruídos, influenciados pelo Iluminismo europeu, que viam na Maçonaria um espaço para debate filosófico e político. Mas esse vínculo com o trono logo se desfez quando os ideais libertários começaram a florescer nas colônias da América Latina.

A Maçonaria e a Independência do México

No início do século XIX, a Maçonaria Mexicana começou a se transformar em uma força revolucionária. Dois importantes líderes da independência, Miguel Hidalgo y Costilla e José María Morelos, ambos padres e maçons, foram figuras centrais na luta contra o domínio espanhol.

  • Miguel Hidalgo, conhecido como o "Pai da Pátria", proclamou o famoso Grito de Dolores em 1810, marco inicial da guerra pela independência.

  • José María Morelos, seu sucessor na luta, também era iniciado e elaborou um projeto de nação que previa igualdade racial, abolição dos privilégios coloniais e soberania popular.

Ambos foram executados pelas forças realistas, mas deixaram um legado duradouro que conectava a causa da liberdade à tradição maçônica.

As rivalidades internas: Yorkinos e Santa Maria

Com a independência finalmente conquistada em 1821, a Maçonaria no México não se unificou. Pelo contrário, dividiu-se em duas correntes rivais:

  1. O Rito de York, sob forte influência dos Estados Unidos, promovia ideias republicanas, federalismo e uma clara separação entre Igreja e Estado. Era apoiado por liberais e reformistas.

  2. A Maçonaria de Santa Maria, de inspiração mais tradicionalista, buscava preservar valores monárquicos ou centralizadores e era mais aberta à influência da Igreja Católica.

Essa divisão refletia não apenas diferenças ritualísticas, mas profundas disputas ideológicas e políticas que atravessaram o século XIX mexicano.

Distanciamento da Igreja Católica

Um dos aspectos mais marcantes da história maçônica mexicana foi sua participação no processo de laicização do Estado. A Maçonaria teve papel central na reforma liberal de 1857, que resultou na nacionalização dos bens da Igreja, na extinção dos tribunais eclesiásticos e na consolidação da educação pública e laica.

Durante o governo de Benito Juárez, um dos mais célebres maçons do México, esse afastamento da Igreja foi intensificado, estabelecendo as bases do México moderno e republicano. Juárez, indígena zapoteca e maçom do Rito de York, tornou-se símbolo da resistência ao clero e ao imperialismo europeu, especialmente durante a ocupação francesa e o curto reinado de Maximiliano de Habsburgo.

A Maçonaria Mexicana hoje

Apesar das perseguições intermitentes — especialmente durante os períodos de instabilidade política e dos confrontos com a Igreja — a Maçonaria sobreviveu e continua ativa no México contemporâneo. Suas lojas espalham-se por todo o país, e a tradição maçônica é respeitada como parte da história nacional.

O México, país de rituais profundos, sincretismos culturais e heranças revolucionárias, abriga uma Maçonaria que carrega orgulhosamente os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade — não como slogans vazios, mas como parte integrante de sua identidade política e espiritual.

A trajetória da Maçonaria no México é uma narrativa de revolução, resistência e construção nacional. Desde os tempos coloniais até os dias atuais, ela tem sido um dos bastidores mais influentes das grandes transformações sociais e políticas do país.

Na terra da tequila e das tradições seculares, a Maçonaria floresceu como um farol discreto, mas constante, iluminando o caminho da liberdade — mesmo nas noites mais escuras da história.


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