Raymond Lull: A Conversão Cristã pela Língua e Não pela Espada

Por Sir Knight James A. Marples, K.T.

Raymond Lull (também grafado como Raimund Lully, Raymond Llull, Raimundus Lullus ou Raimund Llull) foi um dos primeiros cristãos, desde o tempo das Cruzadas, a abandonar a espada para tentar converter os outros pela persuasão e pelo amor à fé cristã. Em vez de recorrer à força, como era comum, Lull utilizou palavras e argumentos, dedicando sua vida à conversão pacífica dos não cristãos. Essa escolha lhe custaria a vida: ele morreu como mártir no Norte da África.

Uma Conversão Pessoal Profunda

Nascido em 1236, na Ilha de Maiorca, Raymond Lull viveu seus primeiros anos como um cortesão frívolo à serviço do Rei Jaime de Aragão. Entregue aos prazeres mundanos, sua transformação espiritual começou após um episódio marcante: ao tentar seduzir uma mulher, ela revelou um seio desfigurado por um câncer. A visão chocante o levou a compreender a futilidade dos prazeres carnais e a despertar para a dor e o sofrimento humanos.

Este evento foi o catalisador para uma conversão profunda. Lull passou a estudar profundamente as crenças judaicas e islâmicas, buscando encontrar pontos de convergência entre as religiões virtuosas e o cristianismo. Como muitos destacam, ele "primeiramente converteu a si mesmo" antes de tentar converter os outros.

A Missão: Evangelizar pela Educação e pela Razão

Ao perceber que as Cruzadas armadas haviam falhado em seu propósito espiritual, Lull decidiu adotar uma abordagem diferente: propôs a criação de escolas missionárias para o ensino de línguas orientais, como o árabe, hebraico e caldeu, a fim de preparar missionários que pudessem converter muçulmanos e judeus por meio do diálogo e da razão.

Aprendendo árabe com um sarraceno, Raymond acreditava que poderia vencer debates teológicos pela lógica, convencendo os sábios muçulmanos da verdade do cristianismo. Sua fé na força dos argumentos foi tamanha que, ao chegar a Túnis em 1291-1292, lançou um desafio: se fosse derrotado nos debates, converter-se-ia ao Islã. Embora tenha conseguido conquistar alguns líderes islâmicos ao cristianismo, também enfrentou oposição violenta, sendo preso e posteriormente expulso sob ameaça de morte.

Perseverança até o Martírio

Raymond Lull nunca desistiu de sua missão. Após visitar Maiorca, Chipre e Armênia, voltou a Bugia, no Norte da África, em 1307. Em 1311, convenceu o Papa a fundar colégios de estudos orientais. Mas foi em sua terceira viagem a Túnis, em 1314, já com cerca de oitenta anos, que encontrou seu destino final. Ao pregar abertamente o cristianismo e a Santíssima Trindade, foi apedrejado por uma turba furiosa e morreu em 1315, provavelmente a bordo de um navio ou em sua amada Maiorca.

Um Pensador à Frente de Seu Tempo

Além de missionário, Lull foi poeta, filósofo, místico, teólogo, astrólogo, matemático e lógico. Ele inventou uma máquina baseada no astrolábio — uma espécie de "computador lógico" rudimentar — que ajudava a estruturar argumentos para apologistas cristãos. Esta criação inspirou posteriormente pensadores como Nicolau de Cusa, Giordano Bruno e Leibniz, sendo considerada precursora da ciência da informação.

Conhecido como "Doctor Illuminatus" (Doutor Iluminado), Lull era um pensador profundamente racional, mas sem abrir mão da fé. Para ele, "Deus é uma essência única com múltiplos atributos, sendo o ser no qual a bondade, a grandeza, a eternidade e outras dignidades se convertem reciprocamente."

Também afirmava: "Nenhuma ciência ou conhecimento é completo sem a ciência do amor a Deus" e "O homem é mais nobre por seu conhecimento do que pelas riquezas que possui."

Reconhecimento e Influência

Raymond Lull foi beatificado pelo Papa Pio IX em 1847, estando a apenas um passo da canonização. Curiosamente, ele também é associado a tradições rosacruzes, embora estudiosos como Arthur Edward Waite ressaltem que Lull não conhecia a Cabala judaica, o que o posiciona como um pensador cristão genuíno e mainstream.

Em sua obra mística "O Livro do Amado e do Amante", Lull delineia quatro virtudes centrais — beleza, ordem, ciência e caridade — valores que ainda hoje são recomendados para o estudo e prática cotidiana, inclusive entre os maçons.

Sir Albert Pike e Sir Albert G. Mackey, dois grandes estudiosos maçônicos, destacaram a importância de Lull, considerando-o um elo entre o misticismo prático, a filosofia e as tradições cristãs.

Um Exemplo de Fé e Coragem

Raymond Lull é um exemplo de devoção, coragem e inovação espiritual. Seu compromisso em propagar o cristianismo sem violência, apenas pela força do conhecimento e da fé, é um legado eterno. Como bem refletiu Sir Knight James A. Marples: seríamos nós capazes de defender nossa fé apenas pela força de nossas palavras, mantendo a espada embainhada?

Lull nos ensina que, mesmo diante do ódio e da incompreensão, a grandeza do ser humano se manifesta na busca incessante pela verdade, pela luz e pelo amor de Deus.

 Adaptação e tradução por Luiz Sérgio Castro

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