Da Redação
Em uma época marcada pelo ruído, pela exposição
constante e pela ânsia por respostas rápidas, a Maçonaria continua a provocar
dúvidas, receios e projeções. Oscilando entre o fascínio e a suspeita, ela
permanece, para muitos, envolta em sombras. No imaginário popular, ela aparece
ora como herdeira de tradições iniciáticas nobres e milenares, ora como uma
força oculta, capaz de influenciar decisões políticas e econômicas por meio de
redes secretas. Mas até que ponto essa visão corresponde à realidade?
O que propomos neste artigo é uma mudança de
olhar. Um convite à escuta silenciosa e à compreensão profunda de uma tradição
que prefere o trabalho à exibição, a reflexão à imposição, a discrição ao
espetáculo. A Maçonaria não se esconde por medo, mas porque considera sagrado
aquilo que preserva.
A Sombra do Suspeito
A história da Maçonaria é entrelaçada com a
própria história das sociedades ocidentais. Na Itália, como no Brasil, ela
frequentemente foi alvo de suspeitas, escândalos e teorias conspiratórias. Isso
se deve, em parte, à sua linguagem simbólica, ao uso do silêncio ritual e ao
caráter reservado de suas atividades. Mas é também reflexo de uma cultura que
tende a transformar o desconhecido em ameaça, o complexo em conspiração.
Contudo, a pergunta que deveria ser feita não é
“o que a Maçonaria esconde?”, mas sim: “o que ela decide custodiar?”. A
diferença entre ocultar e preservar é sutil, porém fundamental. O primeiro
sugere manipulação, o segundo, cuidado. A Maçonaria, nesse sentido, é uma
guardiã. Guarda símbolos, ritos e palavras não para excluí-los do mundo, mas
para protegê-los da banalização.
A Linguagem dos Símbolos
A Maçonaria não é uma doutrina a ser ensinada,
mas uma experiência a ser vivida. Seus símbolos — a esquadria, o compasso, o
avental — não carregam significados fixos. São portais para reflexões,
instrumentos para a construção de um saber que transforma mais do que informa.
O símbolo, ao contrário da explicação racional, exige tempo, silêncio e
maturidade interior.
Viver o símbolo é aceitar que o conhecimento
verdadeiro não se conquista de uma vez, mas se revela em camadas, com
humildade. Por isso a Maçonaria não recruta, não faz proselitismo. Quem entra,
o faz por um chamado interior. Quem permanece, o faz por compromisso com a
própria evolução.
Estrutura e Autonomia das Lojas
Ao contrário do que muitos pensam, a Maçonaria
não é uma organização centralizada e hierárquica. No caso italiano, como no
brasileiro, ela se organiza em diversas Obediências autônomas, com
constituições próprias e liberdade ritualística. Não há um "comando
oculto" global, nem um centro de poder unificado. Cada Loja é um
microcosmo, com sua própria dinâmica e governada democraticamente por irmãos
eleitos.
Mesmo os chamados "graus superiores",
como os do Rito Escocês Antigo e Aceito ou do Rito de York, não conferem
privilégios nem autoridade. São, na verdade, aprofundamentos simbólicos do
caminho interior. A verdadeira soberania reside sempre na Loja Azul, o coração
da Maçonaria simbólica.
O Silêncio como Forma de Resistência
Em tempos de opiniões barulhentas e polarização
constante, a Maçonaria cultiva uma virtude rara: o silêncio. Mas não um
silêncio de omissão. É um silêncio ativo, criador, que permite a escuta e a
transformação. Na Loja, o silêncio é uma disciplina: ensina o valor da palavra
pensada, do gesto ponderado, da presença respeitosa.
O silêncio maçônico é resistência contra a superficialidade. É um gesto político no sentido mais elevado — recusa o espetáculo e afirma um outro modo de estar no mundo: mais profundo, mais atento, mais humano.
A Fraternidade na Vida Civil
Engana-se quem pensa que o trabalho maçônico se
encerra nas paredes do Templo. Ao contrário: o verdadeiro sentido da iniciação
só se revela quando o maçom retorna ao mundo. O que se aprende nos ritos e nas
reflexões deve ser traduzido em atitudes, nas relações, no exercício da
profissão, na participação cidadã.
A Maçonaria não atua como força política ou
ideológica, mas como uma rede silenciosa de presença ética. Muitos irmãos
contribuem de forma concreta nas mais diversas áreas: medicina, educação,
justiça, cultura, filantropia. E o fazem sem alarde, sem buscar aplausos,
apenas com coerência e retidão.
A Discrição como Herança
Mais do que um sistema ou uma instituição, a
Maçonaria representa uma maneira de viver. Em um tempo que valoriza a
velocidade e a exibição, ela ensina a paciência e a profundidade. Ser maçom não
é um privilégio, mas uma escolha: a de construir um Templo interior onde cada
pedra é um ato consciente.
A discrição, tão incompreendida hoje, é sua
maior força. Não é timidez nem medo, mas fidelidade a um caminho que transforma
o homem de dentro para fora. Um caminho que não se impõe, mas que convida. Que
não promete glórias, mas oferece sentido. Que não grita, mas permanece.
Uma Utopia Silenciosa
A Maçonaria, em sua essência, é uma utopia
silenciosa que resiste no coração da modernidade ruidosa. Um espaço onde ainda
é possível ouvir, refletir e construir. Uma escola do ser, não do ter. Um
chamado à interioridade, à ética sem recompensa, ao saber que não se ostenta.
Talvez, justamente por isso, ainda incomode. Porque não oferece explicações fáceis. Porque não se rende ao consumo do sagrado. Porque não grita — apenas continua, discreta, profunda, livre. Pedra por pedra. No silêncio das fundações.
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