Na Maçonaria, os graus simbólicos, Aprendiz,
Companheiro e Mestre, formam a Loja Azul e guardam uma sequência numérica
oculta: 3, 5 e 9. Embora conhecida, poucos se aprofundam em seu real sentido,
analisando-os de forma fragmentada, quando na verdade representam um caminho
contínuo de formação iniciática.
Este ensaio busca lançar uma interpretação
ousada, conectando essa sequência aos ensinamentos das antigas escolas de
mistério, lembrando que o conhecimento maçônico deve ser holístico e não
reduzido a apenas moralidade superficial.
A Ordem Maçônica é um repositório de saberes esotéricos preservados contra perseguições e abriga símbolos que remetem à alquimia, à Cabala e à astrologia. Entre eles, a cor azul se destaca: primária, pura e espiritual, evoca introspecção, serenidade e elevação da alma, relacionando-se ao céu, ao infinito e ao elemento Ar, além de estar ligada a Júpiter e Mercúrio, símbolos da sabedoria e da inteligência. A seguir, dissertemos acerca da sequência 3-5-9:
O número três e o grau de Aprendiz Maçom
O número três é um dos mais poderosos
arquétipos da tradição esotérica, sendo a tríade que reconcilia os opostos e
conduz ao equilíbrio. Representa os ciclos existenciais, as trindades sagradas
e o triângulo, primeira forma geométrica estável.
Na Cabala, está ligado às sefirot superiores, Kether,
Chokmah e Binah, ao mundo da emanação pura, e à letra Ghimel,
símbolo do movimento e da misericórdia que faz a mediação entre o Criador e a
criação. Esotericamente, conecta-se também à Terra, terceiro planeta, onde o
espírito experimenta a dualidade e cumpre sua jornada cármica rumo à centelha
divina.
Astrologicamente, relaciona-se a Gêmeos e a
Mercúrio, arquétipos da dualidade consciente, da mente e da linguagem. Na
alquimia, expressa a tríade sal, enxofre e mercúrio; corpo, alma e espírito, e
as três grandes operações: nigredo, albedo e citrinitas.
No grau de Aprendiz, o iniciado vivencia esse
processo: mergulha no nigredo (a morte do ego), inicia a purificação no albedo
e prepara-se para o despertar solar da consciência, promessa da iluminação
futura.
No Tarô, o número três revela-se na Imperatriz,
arquétipo da criação e da fertilidade, em que a ideia ganha forma e o espírito
se manifesta na matéria. Essa imagem reflete a condição do Aprendiz Maçom, que
dá seus três passos rumo à Luz, gesto que simboliza o despertar da consciência
e o início do trabalho interior.
Enraizado na Terra, o terceiro planeta, ele
atua na matéria, trabalhando a pedra bruta e cultivando em silêncio os valores
que germinarão no futuro, tal como o solo fértil que recebe a semente
iniciática.
O triângulo, primeira figura estável,
representa o equilíbrio entre pensar, falar e agir, sustentado pelos pilares de
Sabedoria, Força e Beleza. Embora ainda limitado à dimensão material, o
Aprendiz já é tocado pela emanação divina de Atziluth, pressentindo a
transcendência.
Sentado na coluna do Norte, associada à energia
feminina e receptiva, ele assume o papel de receptáculo: potência latente que
aguarda ser preenchida pela sabedoria. Assim, a dualidade expressa nas colunas
Boaz e Jachim e no pavimento mosaico não é obstáculo, mas campo de aprendizado,
onde o Aprendiz aprende a integrar opostos e preparar-se como vaso consciente
da Luz.
Assim, o três define o princípio estruturado da
Obra da do Aprendiz: Ghimel, movimento e misericórdia; Terra,
consciência encarnada; triângulo, estabilidade primordial; Imperatriz, terreno
fértil da criação; Mercúrio/Gêmeos, mente desperta; e seu lugar no templo, Boaz,
indicando a passividade necessária para receber o conhecimento .
A iniciação do Aprendiz é reflexo da Grande
Obra Alquímica. No Nigredo, vivido na Câmara de Reflexão, enfrenta o silêncio,
a morte simbólica e o caos necessário para dissolver o ego. No Albedo,
atravessa as provas dos elementos, purificando vontade, emoções e pensamento,
distinguindo essência de aparência. E no Citrinitas, quando a venda é retirada,
recebe a luz: o despertar da visão espiritual, prenúncio do Sol interior que
nasce em sua alma.
Assim, o Aprendiz não é apenas iniciado, mas transmutado. Ele é a matéria e o alquimista, a pedra e a ferramenta, o operário e a obra. Seu compromisso é cultivar a chama que lhe foi confiada, prosseguindo no caminho que conduz à reintegração plena com a Verdade.
O número cinco e o grau de Companheiro Maçom
O número cinco, essência do grau de
Companheiro, manifesta-se no pentagrama erguido, símbolo do Homem Perfeito, aquele
que supera a matéria do quaternário e se eleva ao conhecimento e à
espiritualidade.
Representa Adam Kadmon, arquétipo da humanidade
antes da queda, e integra na alquimia os quatro elementos acrescidos do quinto:
o éter. Sua geometria revela a razão áurea, tornando-se imagem da harmonia
universal e da união entre microcosmo e macrocosmo, ecoando o princípio
hermético: “o que está em cima é como o que está embaixo”.
No templo, o pentagrama resplandece como
Estrela Flamígera, contendo em seu centro a letra G, o Olho da Providência, o
Iod ou o Tetragrama, irradiando a centelha divina e a luz do conhecimento que
desperta a consciência. Não é ornamento, mas chama espiritual que purifica e
ilumina, fogo alquímico que dissolve impurezas e prepara o Companheiro para a
transmutação interior. A Estrela é, assim, a presença do divino no homem, ponte
entre finito e infinito, entre o mundo visível e os mistérios ocultos.
No alfabeto hebraico, o número cinco
corresponde à letra Hei, símbolo do sopro divino e da revelação. Formada
pela união do Daleth (pobreza, mundo material) e do Vav (o que
desce dos céus), ela expressa a presença de Deus que se revela na criação.
No Tetragrama Sagrado, aparece duas vezes,
reforçando sua função de ponte entre mundos. Na Cabala, o cinco remete à sefirá
Gevurah, o rigor e o julgamento, que só encontra equilíbrio em Chesed,
a misericórdia. Assim, o cinco manifesta a justiça divina: firme, mas temperada
pelo amor.
O simbolismo do número expande-se ainda mais:
cinco são os livros da Torá, as divisões dos Salmos, os mandamentos repartidos
nas tábuas; cinco as feridas de Cristo, os pães que alimentaram a multidão, os
sentidos humanos e as extremidades do corpo. Trata-se, portanto, de um número
de revelação, equilíbrio e totalidade.
No Tarô, o cinco se expressa no arcano do
Hierofante (Papa), mestre espiritual e transmissor da tradição, guardião dos
mistérios e ponte entre o divino e o humano. Sentado entre duas colunas, ele
ensina que a verdadeira iniciação une fé e razão, espírito e matéria. É
arquétipo do homem completo: quatro membros e a cabeça, cinco sentidos, cinco
elementos, guiado pela luz da sabedoria.
O número cinco, ligado a Júpiter, arquétipo da
expansão da consciência e da justiça divina, e ao signo de Leão, regido pelo
Sol, expressa a plenitude criadora e a consciência irradiadora do homem que
desperta sua centelha divina. No centro da cruz simbólica, onde se encontra a
rosa mística, o cinco assinala a vitória do espírito sobre a matéria.
No grau de Companheiro, esse princípio
manifesta-se nas cinco viagens, que simbolizam etapas do despertar da
consciência, e nas ferramentas, régua, maço, cinzel, alavanca e esquadro, que
traduzem força, rigor, medida e transformação. O Companheiro não desbasta
apenas a pedra bruta exterior, mas a si mesmo, buscando integrar corpo, mente e
espírito. A Estrela Flamígera, reflexo do Adam Kadmon e do Sol interior,
torna-se o emblema de sua jornada: luz da sabedoria, centro criador e expressão
da harmonia entre microcosmo e macrocosmo.
Assim, o número cinco é o selo da transmutação espiritual: o Companheiro já não apenas aprende, mas começa a ensinar pelo exemplo, tornando-se ponte entre mundos, reflexo vivo da ordem cósmica e irradiador da luz do Espírito.
O número nove e o grau de Mestre Maçom
Passemos agora a especular acerca do número nove e seus mistérios. Este apresenta uma forte conotação com tudo aquilo que é eterno e imortal, na essência e na constância, uma vez que possui uma interessante particularidade matemática: todo número multiplicado por nove termina sempre retornando a este. Por exemplo:
- 3 x 9 = 27 = 2+7 = 9
- 45 x 9 = 405 = 4+5 = 9
- 2758 x 9 = 24822 = 2+4+8+2+2= 18=1+8=9
O número 9 é visto como símbolo de perfeição,
conclusão e transformação. Nas escolas pitagóricas, representava o coroamento
da evolução espiritual, pois resulta do triplo do 3, número sagrado e
harmônico, sendo associado à maturidade do Mestre.
Na alquimia, corresponde ao ponto máximo da
Grande Obra antes da iluminação definitiva, momento em que a matéria já foi
purificada em todas as etapas e resta apenas a depuração final. Relaciona-se à
Trindade Universal, Sal, Enxofre e Mercúrio, elevada ao seu potencial pleno,
simbolizando a reintegração entre o homem e o divino.
Na astronomia e na mitologia, o 9 conecta-se a
Plutão, planeta da morte, do renascimento e da transformação profunda, ligado
ao deus Hades e ao processo iniciático de descida ao inconsciente para resgatar
riquezas espirituais, em que o ego deve morrer para o ser verdadeiro renascer.
Na astrologia, embora Plutão seja regente
moderno de Escorpião, sua posição como nono planeta o coloca como guardião do
portal que liga Escorpião, signo da prova e da purificação, a Sagitário, signo
da expansão e da verdade. Assim, o 9 representa o rito de passagem: a travessia
pelas sombras interiores que encerra um ciclo e abre outro em um nível mais
elevado de consciência.
No alfabeto hebraico, o número nove é
representado pela letra Têt, conhecida como “a letra da bondade” por
iniciar a palavra tov (“bom”), embora também dê origem a termos como tamê
(impuro) e tahor (puro), revelando sua ambivalência. Seu formato fechado
lembra um útero, símbolo de gestação e de ciclos, remetendo aos nove meses
necessários para que a vida se manifeste.
Na Cabala, o nove corresponde à sefirá Yesod,
situada no pilar central da Árvore da Vida como fundamento que equilibra as
polaridades ativa e passiva e conecta o mundo material de Assiah ao
mundo sutil de Yetzirah, marcando o primeiro passo da ascensão rumo a Kether.
No Tarot, está ligado ao arcano do Eremita,
representado por um ancião com manto, lanterna e cajado, arquétipo do iniciado
que se afasta das ilusões materiais para buscar a luz interior e sustentar-se
pela tradição e pela persistência, ocultando sob o manto o conhecimento sagrado
adquirido.
Em sua dimensão geométrica, o número nove se
expressa no Eneagrama ou estrela de nove pontas, figura de grande importância
esotérica, associada à síntese de ciclos, à culminância espiritual e à
integração da consciência. Suas variações de traçado refletem diferentes
padrões energéticos e a estrela é relacionada aos nove planetas, aos nove coros
angélicos e aos nove portais iniciáticos.
Cada ponta corresponde a uma etapa da jornada
espiritual, e o movimento interno de suas linhas simboliza a dinâmica entre
estados de ser. Por isso, o Eneagrama é considerado tanto um selo de proteção
quanto uma chave meditativa, ensinando que a evolução verdadeira é circular e
cíclica, mas ao mesmo tempo se expande em espiral rumo ao infinito.
No Grau de Mestre Maçom, o número nove
revela-se em toda a sua profundidade como símbolo de fechamento de ciclo e
portal para uma nova consciência. A letra hebraica Têt, ligada à ideia
de gestação na escuridão antes da luz, encontra eco na lenda de Hiram Abiff,
cujo corpo ocultado representa a semente depositada na terra à espera do
renascimento.
Essa narrativa concentra o simbolismo do grau:
Hiram, arquiteto do Templo de Salomão, é morto por três companheiros movidos
por ambição e ignorância, que simbolizam as paixões humanas capazes de
corromper o trabalho espiritual. Sua morte dentro do Templo, entendido como o
santuário interno da alma, expressa a dissolução do ego e a desconstrução da
antiga identidade, necessárias para que o iniciado renasça em um novo nível de
consciência.
O sepultamento de Hiram, marcado pela acácia
incorruptível, aponta para a imortalidade da essência e para a certeza da
renovação. Quando desenterrado, a Palavra original não é recuperada, mas
substituída por uma Nova Palavra, sinal de que a verdadeira sabedoria não é
devolvida como antes, mas transformada pela experiência da morte iniciática.
Esse processo corresponde ao simbolismo de Plutão, planeta da morte e da
regeneração, que exige a descida às profundezas e a dissolução do ego para que
a luz possa renascer.
No plano geométrico, o Eneagrama exprime a
culminância espiritual e a integração dos graus anteriores, encerrando a tríade
Aprendiz–Companheiro–Mestre. Na Cabala, o Mestre manifesta a sefirá Yesod,
fundamento que une o invisível ao visível, ponto de transição entre a morte e a
nova vida, tornando-se canal de projeção da luz espiritual no mundo.
No Tarot, essa etapa é representada pelo
Eremita, que caminha solitário iluminado pela lanterna da sabedoria adquirida,
guiando os demais apenas o suficiente para que avancem por si mesmos.
A astrologia reforça a passagem do Escorpião
para Sagitário como chave simbólica: o primeiro representa a prova, a morte e a
regeneração, enquanto o segundo anuncia a visão ampliada e a expansão da
consciência após a travessia. Na alquimia, o Mestre é aquele que, como o
alquimista ao criar a pedra filosofal, unifica Sal, Enxofre e Mercúrio; corpo,
alma e espírito em harmonia.
Assim, o Grau de Mestre não se limita a concluir um percurso, mas consagra a edificação interior, sustentada pela vitória sobre as limitações humanas, pela incorruptibilidade simbolizada pela acácia e pela posse de um novo Verbo criador. É a síntese que integra e eleva, preparando o iniciado para os degraus mais altos da senda iniciática.
Conclusão
A progressão dos números 3, 5 e 9 revela que os
graus simbólicos não devem ser compreendidos como etapas isoladas, mas como uma
jornada iniciática coesa que conduz o homem da matéria à plenitude espiritual.
O Aprendiz, regido pelo três, aprende a
despertar e a trabalhar a pedra bruta; o Companheiro, sustentado pelo cinco,
integra os elementos e harmoniza corpo, mente e espírito; e o Mestre, coroado
pelo nove, experimenta a morte simbólica e o renascimento, alcançando a síntese
de todo o processo.
Esses números, presentes nas tradições
pitagóricas, cabalísticas, alquímicas, astrológicas e cristãs, não apenas
ilustram conceitos filosóficos, mas também funcionam como mapas internos para a
construção do templo interior.
No nove, em especial, encontram-se a perfeição
e o portal para uma nova consciência, lembrando que a iniciação não termina na
Loja Azul, mas continua em planos mais elevados, desafiando o iniciado a
transcender suas próprias limitações.
Assim, a Loja Simbólica, longe de ser apenas um espaço de moralidade ou instrução formal, torna-se o laboratório alquímico da alma, onde cada símbolo é uma chave, cada número um degrau e cada ritual uma preparação para a reintegração com o Divino. O verdadeiro Mestre, ao compreender essa progressão, reconhece que a Obra não se encerra em si mesma, mas se renova continuamente em espiral ascendente, conduzindo à eternidade e à Luz.
(*) João Alexandre Paschoalin Filho, 33
Loja Constância 1147 – Oriente de Campinas
Membro da Academia Campineira Maçônica de
Letras – cadeira 23
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EISENBERG, J.; STEINSALTZ, A. O Alfabeto
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