Da Redação
Há oitenta anos, o prestigioso prêmio foi
concedido ao médico escocês e maçom que, com a descoberta da penicilina — o
primeiro antibiótico do mundo — revolucionou a medicina e salvou milhões de
vidas.
No dia 25 de outubro de 1945, Alexander Fleming
recebeu de Estocolmo um telegrama destinado a mudar para sempre a história da
medicina: ele havia sido agraciado com o Prêmio Nobel de Medicina, ao lado de
sua equipe de Oxford, composta pelo patologista Howard Florey e pelo bioquímico
Ernst Boris Chain. Após anos de pesquisas, intuições e experimentações, Fleming
entrava oficialmente para o panteão da ciência moderna.
A descoberta da penicilina, o primeiro
antibiótico da história, não apenas salvou milhões de vidas como também abriu
caminho para a farmacoterapia moderna.
A
descoberta
Tudo começou na manhã de 28 de setembro de 1928.
Ao retornar de uma viagem com a família a Suffolk, Fleming notou que, entre as
cápsulas de Petri de seu laboratório, havia uma cultura esquecida. Dentro dela,
desenvolvera-se um tipo de mofo, um fenômeno comum — mas o que chamou sua
atenção foi que os bactérias haviam desaparecido, aparentemente destruídas por
aquele fungo, um microrganismo do gênero Penicillium notatum (ou chrysogenum).
Fleming imediatamente testou a substância sobre
diversos tipos de bactérias e, conforme relatou em seu discurso do Nobel,
verificou sua eficácia contra estreptococos, estafilococos, bacilos da difteria
e do antraz, embora não surtisse efeito sobre a salmonela, responsável pelo
tifo.
A revolução científica estava em curso, ainda
que, inicialmente, a comunidade médica não compreendesse totalmente a magnitude
de sua descoberta.
Formação e primeiros passos
Alexander Fleming nasceu em 6 de agosto de 1881,
em Darvel, Ayrshire, na Escócia, filho de uma família de agricultores. Órfão de
pai aos sete anos, revelou desde cedo uma força de vontade notável, superando
grandes dificuldades até ingressar na Faculdade de Medicina do St. Mary’s
Hospital, em Londres, onde se destacou por talento e dedicação.
Em 1900, mudou-se para Londres durante a Guerra
dos Bôeres (Transvaal), com o desejo de alistar-se nos London Scottish e lutar
na África do Sul. Embora tenha sido aceito, acabou não sendo enviado ao front,
pois o número de voluntários já era suficiente. Participou, contudo, dos
treinamentos, desenvolvendo gosto por esportes e tornando-se um excelente
atirador.
Essa habilidade o aproximou de Sir Almroth
Wright, renomado bacteriologista que se tornaria seu mentor e o introduziria ao
mundo da pesquisa científica. Em 1906, Fleming ingressou em sua equipe,
iniciando uma brilhante carreira de pesquisador.
Três anos depois, em 1909, aproximou-se da Maçonaria,
sendo iniciado na Loja Sancta Maria nº 2682, de Londres, onde mais tarde
serviria como Venerável Mestre e Tesoureiro.
Nas trincheiras
Durante a Primeira Guerra Mundial, Fleming
acompanhou Wright, então coronel, a Boulogne-sur-Mer, na França, onde fundaram
um laboratório e centro de pesquisas. Servindo como tenente e depois capitão do
Royal Army Medical Corps, Fleming trabalhou nos hospitais de campanha,
aprimorando o tratamento dos soldados feridos.
De volta a Londres em 1918, descobriu, em 1922,
a lisozima — uma enzima presente no muco nasal, na saliva, nas lágrimas, nos
tecidos e até no ovo — capaz de destruir certas bactérias inofensivas. Estudou
também o mercurocromo, potente antisséptico, porém tóxico, antes de dedicar-se
à penicilina, capaz de eliminar colônias inteiras de bactérias patogênicas.
Da descoberta à produção
Em 1929, Fleming apresentou seus resultados ao Medical
Research Club, mas foi recebido com frieza. Arquivou temporariamente a
penicilina para concentrar-se nos sulfonamídicos, antibacterianos sintéticos da
Bayer, embora sem grande sucesso.
A convicção de que a verdadeira chave estava na
penicilina jamais o abandonou. A colaboração com os pesquisadores de Oxford
permitiu purificar o fungo, obtendo uma substância mil vezes mais potente que a
natural e dez vezes mais eficaz que os sulfonamídicos.
Os testes em animais foram promissores, e em 1940
os resultados foram publicados na revista The Lancet. Dois anos depois,
começaram os testes em humanos, e um amigo de Fleming, acometido de meningite,
curou-se de modo extraordinário, atraindo a atenção da imprensa.
O jornal The Times publicou um editorial
intitulado Penicillium, exaltando as esperanças depositadas na nova substância.
A comunidade científica, o governo britânico e as indústrias farmacêuticas
uniram esforços para acelerar a produção.
Em 1944, a indústria americana iniciou a
fabricação em larga escala, marcando o início de uma nova era na medicina
moderna.
A penicilina e Marlene Dietrich
Entre 1943 e 1945, milhões de doses de
penicilina foram distribuídas a militares e civis, salvando inúmeras vidas. Um
dos casos mais notórios foi o da atriz Marlene Dietrich, que, em 1943, contraiu
pneumonia em Bari, enquanto acompanhava as tropas aliadas. Graças à penicilina
de Fleming, recuperou-se rapidamente, tornando-se uma testemunha célebre da
eficácia revolucionária do novo medicamento.
A popularidade da penicilina cresceu tanto que
inspirou canções: em 1945, Gorni Kramer compôs Amo la penicillina, e em 1948 Roberto
Murolo seguiu o exemplo.
Em 1947, nasceu a Sociedade Produtos
Antibióticos, responsável pela comercialização da Supercillin, a primeira
penicilina italiana. Três anos depois, em 1950, Fleming inaugurou em San
Basilio a maior fábrica europeia de penicilina — hoje abandonada, mas que por
décadas serviu de abrigo a sem-teto.
Fama, honrarias e legado
A fama de Fleming cresceu rapidamente. Em 1944,
foi nomeado cavaleiro pelo rei Jorge VI, e no ano seguinte a revista Time o
destacou em sua capa. No 25 de outubro de 1945, o Prêmio Nobel de Medicina
selou sua consagração definitiva, junto a Florey e Chain.
Em 1946, assumiu a direção do Departamento de
Inoculações do St. Mary’s Hospital, que passou a levar seu nome. Maçom ativo
desde 1935, foi membro da Loja Misericórdia nº 3286 e, a partir de 1942, Primeiro
Grande Diácono da Grande Loja Unida da Inglaterra.
Fleming também foi membro da Pontifícia
Academia das Ciências, reitor da Universidade de Edimburgo (1951–1954) e
recebeu doutorados honoris causa de trinta universidades europeias e
americanas.
Faleceu em 11 de março de 1955, em Londres, vítima de um infarto, deixando à humanidade o medicamento que salvou milhões de vidas — e um legado que jamais será esquecido.
Fonte: Revista Erasmo - GOI


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