“A água
é representada em alquimia por um triângulo invertido. Para os hermetistas,
compõe o princípio úmido da plasticidade, da materialidade, da passividade e da
mutação.
A água é
um princípio feminino, representa o Astral, é o oposto do elemento Fogo, que é
dinâmico e masculino.
Na
Maçonaria, é usada para a primeira purificação da matéria; nas religiões, o
batismo é feito pela Água, simbolizando a purificação, o perdão dos pecados e a
colocação do Espírito na pessoa.”
(“Vade-Mécum
Maçônico”, 2008, p. 20)
Introdução
A água é um
elemento essencial à vida — humana, animal e vegetal.
Desde os tempos
mais remotos, o homem e as civilizações procuraram se estabelecer em locais
onde houvesse água, considerando sua importância vital para a sobrevivência, o
cultivo e o desenvolvimento das comunidades.
No decorrer da
história, a posse de terras com abundância de água motivou inúmeras disputas
territoriais e conflitos.
Podemos dizer
que há um uso profano e um uso sagrado da
água. Desde os tempos bíblicos, esse líquido precioso esteve ligado à
sobrevivência e à espiritualidade, adquirindo simbolismos e rituais diversos.
Na Maçonaria,
especialmente durante a Iniciação, a purificação pela água é uma
prática adotada com origens em cerimônias religiosas, como o batismo.
Enquanto
o Fogo queima as impurezas — num sentido simbólico —, a Água as
lava.
A seguir,
conheceremos as origens e os significados do rito da purificação pela água,
tanto nas religiões quanto na Maçonaria.
A Ablução
ou Purificação Pela Água Nas Grandes Religiões
As abluções são
lavagens rituais de partes do corpo, objetos ou posses, com objetivos de purificação, dedicação
religiosa e preparação para a oração ou sacrifício.
Essas práticas
eram comuns à maioria das religiões da Antiguidade.
No
Judaísmo
A ablução
assume várias formas:
Tevilá – imersão completa do corpo em um micvê;
Netilat
Yadayim – lavagem das mãos com um copo ritual.
Na entrada do
Tabernáculo havia uma bacia de bronze, onde os sacerdotes se
purificavam antes de adentrar o santuário — mais tarde substituído pelo Templo
de Jerusalém.
No
Cristianismo
O batismo é
uma cerimônia derivada dos rituais de purificação judaicos. O apóstolo Paulo menciona
o batismo diversas vezes, referindo-se a ele como o rito pelo qual o pecado é
lavado da alma.
No
Islamismo
A wudu é
a ablução parcial do corpo, realizada antes das orações e da leitura do Alcorão.
A ghusl é
a ablução completa e o tayammum é a ablução a seco, utilizada
quando não há água disponível.
Na
Maçonaria
A palavra ablução vem
do latim ablutione, que significa “lavar” ou “limpar”.
Na Maçonaria,
refere-se à cerimônia pela qual o Recipiendário passa durante
a Iniciação, simbolizando que a limpeza do corpo físico é um
pré-requisito para a pureza da alma.
O Irmão Raimundo
Francisco Xavier, em seu artigo “O Mar de Bronze”, afirmou:
“Chama-se ablução, em Maçonaria, o ato de lavar alguma parte do corpo, o
que é praticado em vários Ritos e principalmente na adoção de lowtons.
A ideia de purificação pela água — que é o significado do batismo — foi
comum a todos os povos: persas, egípcios, hebreus, etruscos, gregos e romanos,
que obedeceram a esta lei prescrita pelos seus cultos religiosos.
A própria religião católica determinava toda espécie de ablução, a
começar pelo batismo.”
A
Purificação Pela Água no Primeiro Ritual do R.E.A.A. no Brasil (1834)
Para
compreender melhor as abluções nos primórdios da Maçonaria brasileira,
recorremos ao Irmão Joaquim da Silva Pires, em “O Roteiro
da Iniciação de Acordo com o Rito Escocês Antigo e Aceito”.
Ele relata que
o primeiro Ritual do R.E.A.A. foi impresso em 1834 pela Typographia
Imperial e Constitucional de Seignot-Plancher & Cia., no Rio de
Janeiro.
Somente
em 1857 o Grande Oriente do Brasil publicou
seu ritual próprio.
“No Ritual de 1834, não havia Mar de Bronze; e no Ritual de 1857,
igualmente, não havia a Cerimônia da Purificação pela Água.
O profano era purificado com a água colocada em um vaso, pelo Mestre de
Cerimônias, e enxugava as mãos com uma toalha.
(...) Quanto à simbologia da Água: ‘Que a água com que fostes purificado
desvaneça de vosso espírito todas as falsas doutrinas com que o mundo profano
possa tê-lo extraviado’.”
(Silva Pires, 2011, p. 106-107)
O Mar de
Bronze
Talvez o leitor
se pergunte: onde entra o Mar de Bronze?
Segundo o mesmo
autor:
“No primeiro Ritual do Rito Escocês Antigo e Aceito do Grande Oriente do
Brasil, impresso em 1857, não existia purificação pela água.
Mais tarde, foi adotada uma cerimônia com o uso de um jarro ou
bacia, em que as mãos do candidato eram introduzidas pelo Irmão Primeiro
Experto.
(...) Em 1928, o Irmão Mário Marinho de Carvalho Behring,
apoiando-se em rituais anteriores, introduziu o Mar de Bronze, que
depois foi adotado pelo Grande Oriente do Brasil — lamentavelmente, pois se
trata de uma peça estranha à tradição maçônica.”
Behring
baseou-se no simbolismo bíblico, mas a introdução do Mar de Bronze na
ritualística maçônica é considerada por alguns estudiosos um paradoxo
histórico e simbólico.
A
Purificação Pela Água em um Ritual Atual
Antes de
prosseguir, é importante destacar que este estudo não se refere a um
rito ou potência específica, mas ao simbolismo maçônico universal.
Na ritualística
moderna do Rito Escocês Antigo e Aceito (R.E.A.A.), a água aparece
na Segunda Viagem ou Prova da Água, uma das quatro
provas elementares — Terra, Ar, Água e Fogo — que compõem a
jornada iniciática.
Durante a Segunda
Viagem, o Candidato é conduzido até o Mar de Bronze.
Com a ajuda
do Primeiro Experto, ele mergulha as mãos na água e as enxuga,
simbolizando a purificação espiritual.
Após a
cerimônia, o Venerável Mestre explica:
“Passastes, Senhor, pela terceira prova — a da Água.
A água em que mergulhastes as mãos é imagem do vasto oceano que banha os
continentes e ilhas.
Nas antigas iniciações, a purificação simbólica da alma se fazia pelo
batismo do corpo, parte indispensável do cerimonial.
O oceano é o símbolo do povo, a cujo serviço se dedicam os verdadeiros
Maçons.
(...) Assim como o marinheiro se lança aos riscos do naufrágio, o
patriota que serve ao povo deve arriscar-se a ser odiado e esmagado pela fúria
cega.”
(Ritual, p. 147-148)
Conclusão
Dos quatro
elementos naturais — Terra, Ar, Água e Fogo —, este estudo
destacou o elemento Água, símbolo ancestral de purificação
e regeneração.
Na Maçonaria,
através da Segunda Viagem, o candidato é purificado pela água em
uma cerimônia análoga ao batismo.
Vimos também o
debate histórico sobre o uso do Mar de Bronze, considerando que o
original bíblico destinava-se aos sacerdotes e não a cerimônias iniciáticas.
Contudo, do
ponto de vista simbólico, seu uso pode ser aceitável enquanto
representação da purificação interior.
Independentemente
de se usar um mar, um jarro ou uma bacia,
o que realmente importa é o simbolismo da cerimônia, pela qual o
recipiendário sai purificado pela Água.
Fontes
Bibliográficas
GIRARDI, João
Ivo. Do Meio-Dia à Meia-Noite – Vade-Mécum Maçônico. Nova Letra
Gráfica e Editora Ltda., 2ª Ed., 2008.
PIRES, Joaquim
da Silva. O Roteiro da Iniciação de Acordo com o Rito Escocês Antigo e
Aceito. Editora Maçônica “A Trolha” Ltda., 1ª Ed., 2011.
Ritual e
Instruções do Grau de Aprendiz-Maçom do Rito Escocês Antigo e Aceito – GORGS, 2010.
UNTERMAN,
Alan. Dicionário Judaico de Lendas e Tradições. Jorge Zahar Editor,
1992.



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