A Maçonaria, conforme recorda Albert Pike em Morals and Dogma, não se confunde com religião, mas mantém inegavelmente uma natureza espiritual e moral. Em seu discurso dirigido ao Primeiro Grau, o grau de Aprendiz, Pike propôs um conjunto de princípios que chamou de “Decálogo” — não para substituir os Dez Mandamentos de Moisés, mas para oferecer aos maçons uma base ética universal, independente de credos particulares.
O Contexto do Decálogo de Pike
O termo Decálogo (do grego dekálogos) costuma remeter aos Dez Mandamentos bíblicos, entregues a Moisés no Monte Sinai. Esses preceitos se tornaram referenciais para a tradição judaico-cristã e continuam a orientar milhões de pessoas até hoje.
No entanto, Pike, ao elaborar seu próprio Decálogo no âmbito do Rito Escocês Antigo e Aceito, buscou algo diferente: não impor dogmas, mas propor uma moralidade aplicável a todos os homens, em qualquer tempo, lugar ou religião. O próprio Supremo Conselho, já em 1871, esclarecia que Morals and Dogma não deveria ser considerado um texto dogmático ou absoluto, mas um convite à reflexão.
Do Particular ao Universal
Enquanto os Mandamentos mosaicos refletiam as necessidades de uma comunidade específica em seu tempo histórico, o Decálogo de Pike foi pensado como uma expressão de valores universais.
Seu primeiro mandamento, por exemplo, não repete a fórmula bíblica “Eu sou o Senhor teu Deus…”, mas afirma:
> “Deus é a Eterna, Onipotente, Imutável Sabedoria, Suprema Inteligência e Amor Inesgotável. Tu o adorarás, reverenciarás e amarás! Honrarás a Deus praticando as virtudes!”
Aqui, não há referência direta ao Deus dos hebreus, mas sim a um Ser Supremo entendido como fonte de sabedoria e amor. É uma linguagem inclusiva, que permite que maçons de diversas tradições religiosas reconheçam o mesmo princípio.
Da mesma forma, o segundo mandamento de Pike propõe que a religião do homem deve ser fazer o bem por prazer e não apenas por dever. Essa máxima se aproxima de ensinamentos cristãos, como os da Epístola de Tiago (1: 27), citada pelo próprio Pike em outro grau, ao falar sobre a pureza da religião manifestada na caridade e na integridade pessoal.
Os Dez Mandamentos Maçônicos
O Decálogo de Pike resume-se em dez princípios:
1. Reconhecer a Deus como Sabedoria,
Inteligência e Amor, honrando-O com virtudes.
2. Fazer o bem pelo prazer de servir,
cultivando a amizade com os sábios e preservando a imortalidade da alma.
3. Lutar contra o vício, agir com justiça e
prudência, mantendo a luz da sabedoria.
4. Honrar os pais, respeitar os anciãos,
proteger os jovens e a inocência.
5. Amar a família, respeitar a pátria e
obedecer às leis.
6. Tratar o amigo como um outro “eu”, sendo
fiel mesmo após sua morte.
7. Evitar amizades falsas, viver com moderação
e cuidar da memória pessoal.
8. Dominar as paixões, aprender com os erros
dos outros e ser indulgente.
9. Ouvir muito, falar pouco, agir bem,
retribuir o mal com o bem e usar o poder com justiça.
10. Conhecer os homens para conhecer a si
mesmo, buscar a virtude, praticar a justiça e cultivar a pureza de pensamento e
ação.
Esses mandamentos constituem um código de vida maçônico que transcende fronteiras religiosas e nacionais.
A Síntese do Amor Fraternal
Embora tenha sistematizado dez preceitos, Pike reconheceu que o maior de todos os mandamentos foi ensinado por Jesus:
> “Um novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros” (João 12: 34).
Na interpretação maçônica, esse amor fraternal é a pedra angular que sustenta todo edifício moral. Quem caminha na luz mas guarda ódio contra o irmão permanece ainda nas trevas.
Conclusão
O Decálogo do Rito Escocês, proposto por Albert Pike, não pretendeu competir com as tradições religiosas, mas oferecer um guia moral para maçons de todas as origens. Ele se apoia na universalidade da razão, na fraternidade entre os homens e na busca pela virtude como caminho para um mundo melhor.
Assim, mais do que um código de conduta, o Decálogo é um chamado: o de trabalhar coletivamente, com sabedoria e amor, na construção de uma sociedade mais justa, iluminada e fraterna.
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