Da Redação
A Bula Papal In Eminenti Apostolatus Specula,
promulgada em 1738 pelo Papa Clemente XII, que condenou a Maçonaria, deve ser
compreendida muito além de uma simples oposição religiosa. Pesquisas recentes
em arquivos diplomáticos internacionais, acervos maçônicos e, especialmente,
nos chamados Stuart Papers conservados no Castelo de Windsor, vêm revelando
documentos até então pouco explorados. Esses materiais lançam nova luz sobre as
complexas rivalidades jacobitas e hanoverianas que marcaram o cenário político
europeu do século XVIII e que influenciaram decisivamente a emissão dessa
condenação papal.
Entre os opositores da Bula dentro da própria
Igreja Católica destacava-se o cardeal Prospero Lambertini, que teria
considerado a medida o “pior erro político” de Clemente XII. Rumores
persistentes indicam que Lambertini teria sido iniciado na Maçonaria, fato que,
se verdadeiro, explicaria sua postura crítica. Dois anos mais tarde, ele
próprio ascenderia ao trono pontifício como o Papa Bento XIV, conhecido por seu
espírito ilustrado e por uma visão mais tolerante. Lambertini e outros clérigos
sabiam que muitos sacerdotes, assim como numerosos jacobitas, eram maçons e não
viam qualquer antagonismo essencial entre a Ordem e a fé católica.
A impopularidade da Bula não impediu que o
príncipe Charles Edward Stuart, o célebre “Bonnie Prince Charlie”, manifestasse
grande interesse em ingressar na Maçonaria. Cercado de amigos na loja romana,
Charles teria solicitado repetidas vezes ao pai, James Stuart, autorização para
ser iniciado. A resposta, segundo ele próprio relatou, foi sempre negativa:
como não era maçom, James afirmava não poder conceder tal permissão ao filho.
Essa postura refletia o profundo respeito do pai pela autoridade papal — respeito
que Charles não compartilhava.
Relatórios dos serviços de inteligência
britânicos da época observavam que o herdeiro Stuart demonstrava uma atitude
liberal em relação à religião, defendendo ao menos a liberdade de consciência.
Tal disposição tornava especialmente atraentes para ele os ideais ecumênicos da
Maçonaria. Algumas tradições escocesas chegam a afirmar que o jovem príncipe
teria desafiado a autoridade paterna e sido iniciado secretamente, tornando-se
até mesmo Venerável Mestre de uma loja romana. Mais tarde, Charles sustentaria
que o Grão-Mestrado secreto dos maçons era hereditário na Casa de Stuart e que
documentos ocultos em Saint-Germain comprovariam tal afirmação.
Nesse mesmo contexto, ganha relevo a figura do
Chevalier Ramsay, natural de Ayr e convertido ao catolicismo. Em 1737, apenas
um ano após a fundação da Grande Loja da Escócia, Ramsay proferiu uma célebre
oração que viria a influenciar o desenvolvimento de graus “superiores” de
caráter templário. O fato de um católico revelar tais ideias a Tessin, um
luterano, e de esse conteúdo só se tornar público décadas depois, na década de
1780, sugere que os maçons jacobitas eram hábeis na arte do sigilo. Esse domínio
da discrição fazia parte de uma estratégia maior para apoiar Charles Stuart em
sua tentativa de reconquistar o trono de seus ancestrais.
Na Suécia, essas tradições ganharam contornos
próprios. Entre os maçons suecos, consolidou-se a crença no papel oculto do
príncipe como Grão-Mestre dos Cavaleiros Templários Maçônicos. Mais tarde, o
rei Gustavo III da Suécia, nomeado em 1783 por Charles como seu sucessor no
Grão-Mestrado, consideraria a Bula In Eminenti uma irrelevância histórica. Ao
abrir o país a católicos e judeus, Gustavo III agia como um maçom realista
convicto, fiel ao que entendia serem as tradições de tolerância religiosa da
Casa de Stuart.
Os novos documentos hoje disponíveis talvez não
resolvam definitivamente as questões sobre os reais motivos políticos ou
religiosos dos maçons jacobitas, nem esclareçam por completo o verdadeiro alvo
da interdição de Clemente XII. Contudo, deixam claro que o tema é
extraordinariamente complexo, enraizado tanto nas disputas religiosas e
políticas das Ilhas Britânicas quanto no amplo contexto internacional da
diáspora jacobita. Revelam, sobretudo, que ainda há muito a aprender a partir
de arquivos pouco explorados em diversos países, onde a história da Maçonaria
continua a guardar segredos à espera de serem revelados.

0 Comentários