Da Redação
Ao participar de um Ritual Maçônico, torna-se
evidente que há um significado misterioso e profundo em cada detalhe de sua
estrutura rigorosamente ordenada. Nada é aleatório: gestos, palavras,
movimentos e disposições espaciais seguem uma lógica precisa, quase como um
mecanismo de relojoaria simbólica. À medida que o maçom aprofunda sua
compreensão desses elementos, percebe que o ritual se apresenta como uma
espécie de representação fractal, refletindo simultaneamente o cosmos e o
próprio indivíduo.
Mas, afinal, o que estamos fazendo quando
participamos de um ritual maçônico? Estamos encenando um mito ancestral?
Reprogramando nossa própria mente? Realizando uma cerimônia mágica? Preservando
uma instituição milenar? Ou, talvez, tudo isso ao mesmo tempo? Qual é, de fato,
a relação entre o ritual maçônico, o mito e a magia?
Sem revelar qualquer aspecto específico dos
rituais, é possível refletir sobre sua importância e seu significado mais
amplo. Suas origens encontram-se na confluência de duas grandes tradições: de
um lado, a Maçonaria Operativa medieval, organizada como as corporações de
ofício, dedicada à construção literal de templos e edifícios sagrados, bem como
à preservação do conhecimento técnico e simbólico associado a essa arte; de
outro, diversas correntes esotéricas e ocultistas — como o Hermetismo, o
Gnosticismo, a Cabala e a Astrologia — frequentemente consideradas heréticas
pelas autoridades religiosas de sua época e, por isso, perseguidas ou
silenciadas. Da união dessas vertentes surgiu a transição da Maçonaria
Operativa para a Maçonaria Especulativa.
O que se torna claro é que tanto o templo
quanto os rituais que nele ocorrem são portadores de um simbolismo vasto e
profundo, organizado em camadas sucessivas. Essas camadas se revelam
gradualmente, à medida que o iniciado avança pelos graus e pelo caminho
maçônico. Não por acaso, a Maçonaria se define como “um peculiar sistema de
moralidade, velado em alegorias e ilustrado por símbolos”. Para qualquer maçom
praticante, torna-se evidente que os símbolos, os movimentos, as palavras e até
a própria disposição do espaço do templo podem ser compreendidos em múltiplos
níveis de significado.
Entre nós e a Verdade transcendente, existe uma
vantagem inegável em transmitir ensinamentos atemporais por meio de alegorias,
rituais, narrativas e objetos simbólicos. Quando a Verdade é reduzida a
palavras fixas ou doutrinas estáticas, ela tende a se cristalizar, tornando-se
rígida e incapaz de evoluir com aqueles que a estudam e vivenciam. Qualquer
mudança passa a ser vista como uma ameaça ao que já está estabelecido. O
símbolo, ao contrário, permanece vivo: mesmo quando preservado em formas
tradicionais ao longo de gerações, ele pode ser continuamente renovado e
reinterpretado, pois seu significado último não é explicitamente dito, mas
intuído.
Quanto ao sentido específico dos símbolos da
Loja e dos rituais, trata-se de um conhecimento que deve ser preservado para os
iniciados. Isso não por elitismo, mas porque a compreensão maçônica desses
símbolos pode ser prejudicada se revelada prematuramente. Além disso, um mesmo
símbolo pode assumir significados diferentes para diferentes maçons, e até para
o mesmo maçom em momentos distintos de sua jornada. Basta dizer que esses
símbolos abrangem desde interpretações físicas e morais até leituras metafísicas
e cósmicas, acessíveis àqueles “que têm olhos para ver”.
Para alguns, é um salto ousado passar da
transmissão simbólica do conhecimento à ideia de prática mágica. Ainda assim,
muitos estudiosos defendem que, na base de todas as grandes religiões e
tradições espirituais, existe um fio mágico subjacente. Conciliar a visão
materialista predominante na cultura moderna com uma concepção mágica da
realidade é um desafio complexo, mas é inegável que várias das tradições que
influenciaram a transformação da Maçonaria Operativa em Especulativa
compartilhavam, cada uma à sua maneira, essa visão de mundo.
Surge então a pergunta: estaria o maçom médio
praticando magia, ainda que inconscientemente? Se aceitarmos, ao menos como
hipótese, que o mundo possui uma dimensão mágica e que os fundamentos dessa
concepção são válidos, torna-se claro que qualquer instituição capaz de
mobilizar crença, emoção e intenção humanas contém, inevitavelmente, um
elemento mágico. Sob essa perspectiva, todas as religiões seriam, em essência,
mágicas, diferenciando-se apenas na forma como essa força é canalizada —
geralmente por meio de sacerdotes ou ministros — ainda que tal redefinição
possa causar desconforto a muitos.
Seguindo essa linha de raciocínio, é plausível
supor que a Arte praticada na Maçonaria também possua um significado e uma
finalidade que ultrapassam o plano meramente simbólico ou intelectual.
Diferentemente de muitas religiões, contudo, essa dimensão mais esotérica da
Maçonaria parece ser explicitamente acessível apenas em determinados contextos
ou ritos de caráter mais místico. Em muitas Lojas, especialmente nas vertentes
mais tradicionais, o foco permanece na fraternidade, na moral e na filantropia.
Essa dimensão esotérica, quando existe, é
frequentemente mal compreendida pelos não iniciados. Daí surgem acusações
recorrentes, presentes em teorias conspiratórias antimaçônicas, que associam a
Ordem a práticas de “magia negra” ou satanismo. Historicamente, foi justamente
para fugir desse tipo de perseguição que muitos pensadores ligados à visão
mágica do mundo encontraram refúgio nas antigas corporações de ofício. Embora
hoje tais acusações tenham menos impacto, elas ainda persistem no imaginário
popular.
Em conclusão à questão proposta — mito ou
magia? —, pode-se dizer que a Maçonaria parece ser ambos, ou talvez nenhum
deles de forma absoluta. Em última análise, a Maçonaria é aquilo que cada um
faz dela. Ainda assim, independentemente da interpretação individual, há na
Ordem algo que parece transcender o plano físico e intelectual, manifestando-se
como uma presença coletiva, quase uma consciência própria. O conceito ocultista
de egrégora pode ser útil para compreender esse fenômeno. Seja qual for a
explicação, parece evidente que a Maçonaria contém um elemento que ultrapassa o
racional e toca o campo do simbólico profundo — ou mesmo do mágico —, ainda que
nem todos os maçons o reconheçam dessa forma.
Baseado em texto de Jonathan Dinsmore.

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