Pobreza, Desigualdade e o Dever Ético da Maçonaria


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Da Redação

Compreender o que entendemos por pobreza e como a medimos é um dos grandes desafios do nosso tempo. Esses conceitos não são meramente teóricos: deles decorrem objetivos, métricas e ações concretas que moldam políticas públicas, projetos privados e estratégias de desenvolvimento capazes de definir o futuro de uma nação no curto, médio e longo prazo. Consequentemente, determinam também o destino de milhões de pessoas, não apenas em termos de renda, mas de dignidade, bem-estar social e possibilidades reais de realização humana.

Durante muito tempo, a pobreza foi associada quase exclusivamente à falta de renda. Hoje, essa visão se mostra insuficiente. A pobreza é um fenômeno multidimensional, profundamente ligado à desigualdade e às estruturas de poder. Viver em situação de pobreza significa ter maior probabilidade de morrer de doenças evitáveis, enfrentar taxas mais elevadas de mortalidade infantil, não ter acesso adequado à educação, à saúde, à moradia digna e à água potável. Significa também maior vulnerabilidade à violência e ao crime, exclusão do sistema de justiça, marginalização política e afastamento da vida comunitária.

A pobreza, portanto, não é apenas carência material; é também ausência de voz, de poder e de oportunidades. Para enfrentá-la de forma efetiva, é indispensável compreender as complexas redes de relações políticas, econômicas e sociais que perpetuam a discriminação e condenam indivíduos, comunidades e povos inteiros a gerações de exclusão. Em muitos países em desenvolvimento, a pobreza ainda é definida pela incapacidade de satisfazer necessidades alimentares básicas, e sua forma persistente recebe o nome de pauperismo. Quando comparada entre nações, passa a ser denominada subdesenvolvimento, revelando desigualdades estruturais no sistema global.

É nesse contexto que a reflexão maçônica se torna particularmente relevante. A Maçonaria, alicerçada nos princípios universais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, se afirma como uma escola de aprimoramento ético a serviço da humanidade. Seu compromisso com a paz, a justiça e o progresso moral, intelectual e material da sociedade impõe aos seus membros o dever de respeitar crenças, opiniões e diferenças, praticando a tolerância e a harmonia entre os povos. Como bem observou René Guénon, em Aperçus sur l’initiation, o grau de degeneração do Ocidente moderno faz com que muitos valores tradicionais e iniciáticos sobrevivam apenas como vestígios, frequentemente incompreendidos até mesmo por aqueles que os preservam.

Para nós, maçons, a questão da pobreza não pode ser dissociada da luta contra o privilégio. Reconhecemos que sempre haverá pessoas vivendo em situação de pobreza, dadas as múltiplas dimensões da condição humana e a liberdade de pensamento e ação de cada indivíduo. Contudo, é moralmente inaceitável negar a essas pessoas a igualdade de oportunidades para superar suas circunstâncias. O verdadeiro combate não é contra os pobres, mas contra os mecanismos de discriminação — especialmente aqueles ligados à “condição de nascimento” — que erguem barreiras quase intransponíveis à ascensão social.

A desigualdade funciona como um instrumento de pressão pelo qual as camadas superiores impedem a mobilidade das inferiores, seja na política, na economia, na cultura, na educação ou em outras esferas da vida social. Enquanto isso, os menos favorecidos lutam para ascender em uma sociedade que frequentemente reserva seus benefícios a poucos privilegiados. Nesse cenário, a liberdade — que, como ensinou Naiman de Bratslav, é o mundo da alegria — só se torna plena quando acompanhada da igualdade de oportunidades e da fraternidade ativa.

Devemos refletir e lutar pela igualdade precisamente porque o mundo físico é profundamente desigual. É verdade que os homens não nascem iguais em talentos, condições ou contextos sociais; mas é igualmente verdadeiro que todos compartilham uma dignidade essencial. Compreender a interconexão entre as diferentes dimensões da desigualdade permite apreender a complexidade do fenômeno e evidencia que seu enfrentamento exige ações coordenadas em três níveis: o microssocial, o intermediário e o macrossocial.

Embora muitas constituições democráticas proclamem que “todos os homens são criados iguais e nascem livres”, sabemos que a igualdade formal não garante, por si só, justiça social. Ainda assim, a igualdade perante a lei e a igualdade de oportunidades permanecem ideais fundamentais, defendidos pelas forças progressistas e inerentes à prática maçônica.

Daí a força permanente e a validade absoluta da nossa premissa: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Não como palavras vazias, mas como princípios vivos, que nos convocam à ação consciente e solidária na construção de uma sociedade mais justa, inclusiva e verdadeiramente humana.

 

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